Resolução do Conselho de Ministros n.º 113/2005
Confagri 01 Jul 2005
113/2005
Aprova o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água – Bases e Linhas Orientadoras (PNUEA).(D.R. n.º 124, I-Série-B)
Presidência do Conselho de Ministros
Resolução do Conselho de Ministros N.º 113/2005
A água é um factor essencial para o desenvolvimento sócio-económico do País, devendo ser encarada como um recurso natural estruturante e estratégico. Assim, torna-se necessário garantir um uso eficiente, racional e parcimonioso deste recurso, fazendo desse desígnio uma das linhas orientadoras da política de gestão da água em Portugal.
A necessidade de se proceder desta forma é uma exigência para os poderes públicos e merece uma crescente adesão por parte da sociedade, pois é cada vez mais generalizadamente reconhecido que a água:
É um recurso limitado que é necessário proteger, conservar e gerir com preocupações ambientais;
Constitui uma necessidade estratégica, pelo que é necessário avaliar as disponibilidades, conter as necessidades e promover reservas de água no País, nomeadamente para ocorrer a situações críticas de seca;
Corresponde a um interesse económico a nível nacional, na medida em que os desperdícios de água representam uma deseconomia para o País com um valor muito relevante;
Corresponde a um interesse económico a nível do tecido empresarial, na medida em que a água é, em numerosos sectores de actividade económica, um importante factor de produção;
Corresponde a um interesse económico a nível das entidades gestoras da água, dado que um uso eficiente e parcimonioso permite uma maior racionalidade dos investimentos;
Corresponde a um interesse económico a nível dos cidadãos, na medida em que permite uma redução dos encargos com a disponibilização da água;
Constitui um tema importante para a satisfação das obrigações do País em termos de normativo comunitário, dado que se trata de uma das áreas que tem sido objecto de um maior número de directivas comunitárias.
Nestas circunstâncias, tem vindo o País a desenvolver um esforço de planeamento, materializado por uma primeira geração de planos de bacia hidrográfica e nacional da água, aprovados em 2000 e 2001, e, infelizmente, quase esquecidos nos anos subsequentes.
Foi desenvolvido, também, um importante esforço interministerial e interdepartamental visando estabelecer as linhas orientadoras de um Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA), iniciativa prevista, aliás, no Plano Nacional da Água e que contou com a coordenação do Instituto da Água e o apoio técnico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
Este Programa, que importa aprofundar, consolidar e pôr em prática, contribuirá para uma nova abordagem aos temas da água em Portugal, no quadro do conceito de desenvolvimento sustentável.
Com efeito, um uso eficiente, racional e parcimonioso deste recurso e a preservação da sua boa qualidade ecológica constituem as melhores garantias de que Portugal possa dispor dos recursos hídricos de que necessita num horizonte transgeracional.
Num momento em que o País se prepara para estruturar o próximo ciclo de utilização dos apoios comunitários, é mais relevante do que nunca construir e consolidar políticas que visem para além da disponibilidade desses fundos. Este desígnio precisa de ser assimilado por todos os agentes económicos e pela sociedade em geral. No que se refere a políticas públicas, ele diz respeito não apenas ao ministério que tutela as políticas da água mas a todos os ministérios que, de uma forma ou de outra, são relevantes para a boa utilização do recurso.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 – Aprovar o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água – Bases e Linhas Orientadoras (PNUEA), em anexo a esta resolução e que dela faz parte integrante, o qual tem como principal objectivo a promoção do uso eficiente da água em Portugal, especialmente nos sectores urbano, agrícola e industrial, contribuindo para minimizar os riscos de escassez hídrica e para melhorar as condições ambientais nos meios hídricos.
2 – Considerar que o PNUEA constitui um instrumento programático no domínio dos recursos hídricos, que:
a) Deve orientar a actuação dos agentes públicos na sua actividade de planeamento e gestão, incluindo a actividade de licenciamento;
b) Deve veicular o comprometimento de agentes públicos e privados, nomeadamente através de compromissos específicos no domínio da promoção do uso eficiente da água, especialmente nos sectores urbano, agrícola e industrial.
3 – Será criado, por despacho conjunto do Ministro de Estado e da Administração Interna, do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, do Ministro da Economia e da Inovação, do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, um grupo interministerial, o qual definirá, numa primeira fase, a metodologia de trabalho a adoptar e os objectivos específicos do PNUEA, bem como a sua programação de execução material e de execução financeira, e, numa segunda fase, as medidas específicas para cada sector.
4 – Reconhecer que o êxito do PNUEA depende em larga medida da capacidade de realizar parcerias com instituições públicas, nomeadamente nas áreas da agricultura, da indústria e da administração local, e privadas, nomeadamente entidades gestoras, associações de utilizadores, organizações não governamentais profissionais e de defesa do ambiente e instituições de ensino e investigação que intervenham em áreas relevantes para os propósitos do PNUEA.
5 – Estabelecer que a presente resolução do Conselho de Ministros produz efeitos a partir do dia seguinte ao da sua publicação.
Presidência do Conselho de Ministros, 5 de Junho de 2005. – O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
ANEXO
PROGRAMA PARA O USO EFICIENTE DA ÁGUA
BASES E LINHAS ORIENTADORAS
1 – Natureza do Programa. – O Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água – Bases e Linhas Orientadoras (PNUEA) tem como principal finalidade a promoção do uso eficiente da água em Portugal, especialmente nos sectores urbano, agrícola e industrial, contribuindo para minimizar os riscos de escassez hídrica e para melhorar as condições ambientais nos meios hídricos.
O PNUEA contribui para a consolidação de uma nova cultura da água em Portugal, através da qual este recurso seja crescentemente valorizado, tanto pela sua importância para o desenvolvimento humano e económico como pela preservação e valorização do meio natural, no espírito do conceito de desenvolvimento sustentável.
A necessidade de se proceder a um uso cada vez mais eficiente da água disponível, optimizando a utilização desse recurso (eficiência de utilização), não deve pôr em causa os objectivos pretendidos (de eficácia de utilização) ao nível das necessidades vitais, da qualidade de vida e do desenvolvimento sócio-económico.
Adicionalmente, como benefícios indirectos, pretende-se alcançar a redução dos volumes de águas residuais afluentes aos meios hídricos e do consumo de energia, aspectos fortemente dependentes do consumo de água.
2 – Âmbito. – O PNUEA aborda exclusivamente o problema do uso eficiente da água a nível nacional e considera apenas os usos consumptivos.
A participação da Região Autónoma dos Açores e da Região Autónoma da Madeira no desenvolvimento desta política de cariz nacional pressupõe necessariamente o respeito integral pela esfera de competências próprias das autonomias regionais, devendo dar-se primazia ao princípio da articulação como via para esta integração.
3 – Conteúdo. – O PNUEA visa ter um enquadramento geral do estado do uso da água em Portugal e das orientações nacionais para o uso eficiente da água, que se consubstanciará nas áreas programáticas e nas metas para os sectores urbano, agrícola e industrial apresentadas nos n.os 4 a 7 deste anexo.
4 – Enquadramento geral. – A procura de água em Portugal foi estimada pelo Plano Nacional da Água em 2001 em cerca de 7500 milhões de metros cúbicos/ano, a que corresponde um custo global de produção para a sociedade estimado em 1880 milhões de euros/ano, tendo por base os custos reais da água, o que representava 1,65% do produto interno bruto português, estimado pelo Ministério das Finanças para o ano 2000 em 114000 milhões de euros.
Em termos de procura por sectores, e tendo por base o Plano Nacional da Água, verifica-se que a agricultura é o maior utilizador de água em Portugal, com 87% do total, contra 8% do total no abastecimento urbano às populações e 5% do total na indústria.
Quanto aos custos efectivos de produção da água para os diversos tipos de utilização, verifica-se que o sector urbano passa a ser o mais relevante, correspondendo a 46% do total, seguido da agricultura com 28% do total e da indústria com 26% do total.
Nem toda esta água que é captada é efectivamente aproveitada, na medida em que há uma parcela importante associada a ineficiência de uso e a perdas. Estes volumes elevados indiciam, assim, potenciais de poupança muito importantes.
5 – Fundamentos estratégicos do Programa. – Sendo a água um factor essencial para o desenvolvimento sócio-económico do País, deve a mesma ser considerada como um recurso estratégico e estruturante, tendo necessariamente de se garantir uma elevada eficiência do seu uso.
Esta opção corresponde, designadamente:
A um imperativo ambiental, pela necessidade de uma crescente consciencialização da sociedade de que os recursos hídricos não são ilimitados e que portanto é necessário protegê-los e conservá-los. Um esforço de aumento da eficiência traduz-se numa redução de caudais captados e dos volumes de águas residuais afluentes aos meios hídricos, contribuindo para não delapidar as disponibilidades e reservas estratégicas de recursos, bem como para a conservação e qualidade dos ecossistemas dulciaquícolas;
A uma necessidade estratégica ligada às disponibilidades e reservas de água no País, na medida em que, embora à escala nacional e anual Portugal não tenha grandes problemas de escassez de água em situação hídrica normal, podem no entanto ocorrer situações críticas de seca, sazonais ou localizadas. Estas situações podem ser de carácter quantitativo, resultantes por exemplo de períodos de maior escassez hídrica, ou de carácter qualitativo, com redução das disponibilidades de água com a qualidade necessária, resultante por exemplo de acidentes de poluição.
Salvaguarda ainda:
Um interesse económico a nível nacional, na medida em que as poupanças potenciais de água representam um valor muito relevante;
Um interesse económico a nível do tecido empresarial, na medida em que a água é um importante factor de produção em numerosos sectores de actividade económica. Adicionalmente, melhora a imagem associada à ecoeficiência empresarial, que se traduz numa mais-valia importante no mercado concorrencial;
Um interesse económico a nível das entidades gestoras da água, através de uma maior racionalidade de investimentos, na medida em que permite um melhor aproveitamento das infra-estruturas existentes, adiando ou, em alguns casos, evitando a necessidade de ampliação e expansão dos sistemas de captação e transporte de água para abastecimento e de transporte e tratamento de águas residuais, para acompanharem o desenvolvimento urbano, agrícola e industrial, com a única preocupação de se garantir a resposta à procura pelos utilizadores;
Um interesse económico a nível dos cidadãos, na medida em que permite uma redução dos encargos com a disponibilização da água, sem prejuízo da qualidade de vida do seu agregado familiar e da salvaguarda da saúde pública;
A satisfação das obrigações do País em termos de legislação comunitária, nomeadamente da Directiva Quadro da Água e da Directiva Relativa à Prevenção e Controlo Integrado da Poluição;
O esforço de planeamento que o País tem vindo a desenvolver, materializado nos planos de bacia hidrográfica e no Plano Nacional da Água, que corresponde concretamente ao desenvolvimento do Programa n.º 7, «Conservação dos recursos hídricos», eixo n.º 3, «Gestão sustentável da procura», do Plano Nacional da Água, que inclui a medida P7M1, «Uso eficiente da água – Abastecimento público e industrial», e a medida P7M2, «Eficiência da rega e controlo das perdas – Rega»;
O Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais, que explicita, nas suas linhas de acção estratégicas, a promoção da poupança e do uso eficiente da água, para além de aspectos específicos associados, como a reutilização de efluentes tratados e a redução de perdas de água e substituição de redes.
6 – Estrutura do Programa. – O PNUEA assenta sobre quatro áreas programáticas, compreendendo cada uma delas um conjunto de acções:
AP1 – Medição e reconversão de equipamentos de utilização da água;
AP2 – Sensibilização, informação e educação;
AP3 – Regulamentação e normalização;
AP4 – Formação e apoio técnico.
Para cada área programática, serão definidas acções, entendidas como um conjunto de tarefas para aplicar medidas, executadas por diferentes organismos participantes na implementação e dirigidas a diferentes sectores ou grupos de utilizadores. Para cada acção deverão ser definidos os responsáveis pela sua implementação, os destinatários e o conjunto de medidas a promover no seu âmbito.
As prioridades de aplicação para cada medida obedecem aos seguintes critérios:
Prioridade de aplicação elevada (nível 1) – aplicável às medidas que conduzam a poupanças muito significativas, que sejam fáceis de implementar, que tenham uma relação custo benefício favorável e em que a perspectiva de generalização seja elevada;
Prioridade de aplicação média (nível 2) – aplicável às medidas que conduzam a poupanças significativas, com implementação exequível, com uma relação custo benefício razoável ou em que a perspectiva de generalização seja média ou elevada;
Prioridade de aplicação baixa (nível 3) – aplicável às medidas que conduzam a poupanças baixas, de difícil implementação, com uma relação custo benefício discutível ou com baixa perspectiva de generalização.
O estabelecimento destas prioridades pode ser reavaliado à escala regional em função da razão entre necessidades e disponibilidades de água, o que pode conduzir nas regiões de maior carência hídrica a um aumento da prioridade relativamente à situação média nacional.
7 – Metas para o uso da água no horizonte de vigência do Programa. – A definição de metas para o PNUEA passa pela definição de um indicador que traduza a eficiência de utilização da água em qualquer dos sectores considerados, tornando directa e transparente a comparação entre metas e resultados obtidos, simplificando uma situação que de outro modo seria complexa. Assim:
a) Meta no consumo urbano. – Em termos de consumo urbano, tendo-se estimado o consumo útil total actual em 330 milhões de metros cúbicos/ano e calculando-se uma procura efectiva total em 570 milhões de metros cúbicos/ano, verifica-se que a eficiência actual de utilização da água é de cerca de 60%.
Tendo em conta as perspectivas de evolução em termos de controlo de perdas, de procedimentos dos utilizadores e de evolução tecnológica dos equipamentos, propõe-se atingir, ao fim de um período de 10 anos, uma eficiência de utilização da água de 80%.
Tendo em conta a variabilidade geográfica e social do País, de que resultam situações muito diferenciadas, é expectável que esta média nacional possa atingir variações apreciáveis à escala regional ou local;
b) Meta no consumo agrícola. – Em termos de consumo agrícola, tendo-se estimado o actual consumo útil total em 3800 milhões de metros cúbicos/ano e calculando-se uma procura efectiva total em 6550 milhões de metros cúbicos/ano, verifica-se que a actual eficiência de utilização da água é de cerca de 60%.
Tendo em conta as perspectivas de evolução em termos de área regada, de procedimentos dos utilizadores e de evolução tecnológica dos equipamentos, propõe-se atingir a 10 anos uma eficiência de utilização de água de 65%.
Tendo em conta a variabilidade geográfica e social do País de que resultam situações muito diferenciadas, é expectável que esta média nacional possa atingir variações apreciáveis à escala regional ou local;
c) Meta no consumo industrial. – Na análise das eficiências no uso da água destinada à indústria, é importante considerar-se a grande variedade de processos inerente à actividade industrial bem como a complexidade tecnológica associada a cada processo. Assim, e apesar dos factores de incerteza associados à presente análise, é possível considerar valores médios ponderados.
Em termos de consumo industrial, tendo-se estimado o consumo útil actual em 275 milhões de metros cúbicos/ano e calculando-se uma procura efectiva total em 385 milhões de metros cúbicos/ano, verifica-se que a actual eficiência de utilização da água é de cerca de 70%.
Tendo em conta as perspectivas de evolução em termos de procedimentos dos utilizadores industriais e de evolução tecnológica dos equipamentos, propõe-se atingir ao fim de um período de 10 anos uma eficiência de utilização da água de 85%.
Tendo em conta a variabilidade anteriormente referida em termos tecnológicos e nos processos nos vários sectores de actividade industrial, resultando de situações muito diferenciadas, é expectável que esta média nacional, quando interpretada sectorialmente, possa atingir variações significativas mas com tendência para reduzir no horizonte do Programa.
8 – Modelo organizacional. – Os organismos da administração central na esfera dos Ministérios do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, da Economia e da Inovação, da Administração Interna, da Educação e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações serão os responsáveis pela implementação das diversas acções.
No processo de implementação serão envolvidas as entidades gestoras dos sistemas de abastecimento, associações de utilizadores finais, organizações não governamentais e instituições de ensino e investigação.
9 – Linhas de actuação. – A implementação do PNUEA prevê, no que respeita à relação entre a Administração e os destinatários, linhas de actuação em dois sentidos: uma linha receptiva, partindo dos interessados, e uma linha proactiva, partindo dos promotores do PNUEA.
Os destinatários são as entidades gestoras dos sistemas de abastecimento, os consumidores domésticos, colectivos, comerciais, agrícolas e industriais e, ainda, os profissionais de áreas afins e os docentes e discentes.
A dinamização e estruturação da iniciativa dos destinatários com vista à implementação do PNUEA deverá ser potenciada pela criação de parcerias, tendo em conta o papel central da actuação dos organismos da Administração Pública com intervenção nos sectores urbano, agrícola e industrial e o papel dos parceiros económicos e sociais.
10 – Avaliação do Programa. – O PNUEA pressupõe a recolha e o tratamento da informação relevante de carácter estatístico, técnico e científico, bem como a avaliação da execução das acções.
11 – Vigência. – O PNUEA vigora por um prazo não inferior a 10 anos, devendo ser alvo de revisão em função do resultado das avaliações intercalares e sempre que se verifique uma significativa necessidade de reponderação dos interesses públicos que visa prosseguir.