Resolução do Conselho de Ministros n.º 119/2004
Confagri 03 Ago 2004
119/2004
Aprova o Programa Nacional para as Alterações Climáticas. (D.R. n.º 179, I-Série-B)
Presidência do Conselho de Ministros
Resolução do Conselho de Ministros N.º 119/2004
Na sequência da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas de 1992, a comunidade internacional adoptou, em 1997, o Protocolo de Quioto, com vista a garantir o combate efectivo às alterações climáticas através do estabelecimento de compromissos quantificados de limitação ou redução das emissões dos seis principais GEE por si regulados e tendo em vista uma redução global, até 2012, a níveis, pelo menos, 5% abaixo dos níveis de 1990.
Nos termos do Protocolo de Quioto, é permitido que a Comunidade Europeia e os seus Estados membros cumpram em conjunto os seus compromissos. Foi assim estabelecida uma meta de redução global de 8% das emissões de GEE para a Comunidade Europeia, sendo definidas, ao abrigo do compromisso comunitário de partilha de responsabilidades, metas diferenciadas para cada um dos Estados membros. Neste âmbito, Portugal obrigou-se a limitar o aumento das suas emissões a 27% relativamente aos valores de 1990.
Portugal aprovou o Protocolo de Quioto em Março de 2002 (através do Decreto n.º 7/2002, de 25 de Março) e a Comunidade Europeia, em Abril desse mesmo ano, veio formalizar o compromisso comunitário com a aprovação do Protocolo e do Acordo de Partilha de Responsabilidades entre os Estados membros (através da Decisão n.º 2002/358/CE, de 25 de Abril, do Conselho).
A Comunidade Europeia e os Estados membros têm desenvolvido os seus próprios esforços no combate às alterações climáticas. O Programa Europeu para as Alterações Climáticas [COM (2000) 88, final] estudou e apresentou políticas e medidas comunitárias orientadas para a redução de emissões provenientes de fontes específicas.
Nesse sentido, em 2003, foi aprovada a Directiva n.º 2003/87/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro. Recentemente, foi aprovada a directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva n.º 2003/87/CE, que visa ligar o comércio comunitário de licenças de emissão de GEE com os mecanismos de projecto do Protocolo de Quioto (implementação conjunta e mecanismo de desenvolvimento limpo).
A União Europeia iniciou recentemente a preparação de estratégias e metas a médio e longo prazos no domínio da redução das emissões, com vista a uma análise por parte do Conselho Europeu da Primavera em 2005. Nesse contexto, será obviamente fundamental ter em conta as circunstâncias presentes e as tendências futuras no combate mundial às alterações climáticas, na liderança do qual a União Europeia e os seus Estados membros estão empenhados.
Ao nível nacional, tem-se igualmente dado resposta ao problema das alterações climáticas e aos compromissos internacionalmente assumidos. Nesse sentido, foi elaborado pela Comissão para as Alterações Climáticas (CAC), de carácter interministerial, criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/98, de 29 de Junho, o Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC). A sua primeira versão foi apresentada a discussão pública em 2002. Em Dezembro de 2003, a CAC aprovou as medidas adicionais do PNAC, que foram igualmente objecto de discussão pública.
O PNAC procura quantificar o esforço de mitigação das emissões necessário para o cumprimento dos compromissos assumidos por Portugal, identificando as responsabilidades sectoriais – numa óptica de equidade intersectorial – e apresentando um conjunto de políticas e medidas e respectivos instrumentos que permitam uma intervenção integrada com o objectivo de mitigação das emissões.
Espera-se que o conjunto das medidas incluídas no cenário de referência permita reduzir de 7,6 Mt a 8,8 Mt CO(índice 2)e no período 2008-2012, face ao cenário business as usual.
As medidas adicionais aqui apresentadas deverão ainda ser especificadas em termos da sua inserção e coerência – numa perspectiva transversal – com as políticas definidas e a definir pelo Governo. Naturalmente, esta especificação deverá determinar o seu impacte, eficiência e eficácia em termos económicos e ambientais, num quadro dinâmico de implementação do PNAC.
Não obstante, com a actual configuração das medidas adicionais é possível esperar-se uma redução potencial de 6,7 Mt a 7 Mt CO(índice 2)e.
O PNAC contém políticas públicas de investimento e incentivos para sectores como os dos transportes, oferta de energia e pecuária.
Na sequência da Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, de 28 de Abril, que consagrou as principais medidas de política energética portuguesa, o PNAC assumiu igualmente como sua linha de força a aposta no sector da energia, nomeadamente nas energias renováveis, como a hídrica e a eólica, a biomassa e a fotovoltaica. Neste sentido, salienta-se que as medidas constantes do PNAC afectas ao sector energético contribuem em mais de 40% para o esforço total proposto de redução de emissões de GEE.
O PNAC incide também no sector dos transportes, em particular através do investimento nos transportes públicos, e, nomeadamente, na ferrovia. Incluem-se ainda medidas relativas à expansão das redes de metro de Lisboa e do Porto, à construção do metro do Sul do Tejo e ao contributo das autoridades metropolitanas de transportes em termos da optimização das redes de transportes das principais cidades portuguesas.
O PNAC inclui ainda a proposta de tributação das emissões de carbono em condições a definir, como medida transversal por excelência, envolvendo todos os sectores de forma equitativa e objectiva.
O regime do comércio europeu de emissões foi entretanto objecto de elaboração no nosso país através da elaboração da proposta de programa nacional de atribuição de licenças de emissão (PNALE) para o período experimental da directiva de 2005 a 2007. O mercado europeu de emissões permite criar as condições para que as instalações nacionais abrangidas possam utilizar este mecanismo de mercado como a sua contribuição para o esforço nacional de mitigação das emissões de gases com efeito de estufa.
Importa, por isso, em particular, continuar a definição dos instrumentos económico-financeiros do PNAC, nomeadamente a tributação sobre o carbono e a definição dos meios financeiros adequados à participação nacional nos mecanismos de projecto do Protocolo de Quioto (implementação conjunta e mecanismo de desenvolvimento limpo).
Finalmente, as questões das alterações climáticas devem ser entendidas não só do ponto de vista da mitigação das emissões de gases com efeito de estufa mas também em termos da investigação das mudanças climáticas. Nesse sentido, os Ministérios da Ciência e do Ensino Superior e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente têm vindo a desenvolver linhas de apoio à investigação científica e à avaliação de impactes das alterações climáticas em Portugal, que serão integradas, nomeadamente, na implementação da estratégia nacional de desenvolvimento sustentável.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 – Aprovar o Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC-2004), cujo relatório síntese, integrando as políticas, medidas e instrumentos constantes do cenário de referência e o conjunto de medidas adicionais, consta do anexo do presente diploma e dele faz parte integrante.
2 – Ter em conta as orientações do PNAC na implementação da estratégia nacional de desenvolvimento sustentável.
3 – Incumbir os Ministros de Estado e das Finanças, da Economia, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente de apresentar, até 31 de Julho de 2005, uma proposta de definição dos instrumentos económico-financeiros do PNAC-2004 e consequentes incidências fiscais.
4 – Incumbir a Comissão para as Alterações Climáticas, criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/98, de 29 de Junho, e alterada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 59/2001, de 30 de Maio, de elaborar, até 31 de Dezembro de 2004:
a) Um programa de monitorização e avaliação do PNAC, baseado num conjunto de indicadores de execução e eficácia das medidas nele preconizados, que inclua, nomeadamente:
i) A definição das responsabilidades sectoriais em matéria de aplicação das respectivas medidas;
ii) A concepção dos indicadores de execução e eficácia;
iii) A obrigação de produção de relatórios de informação periódica (com periodicidade bienal, a partir de 2005) sobre a efectividade das medidas preconizadas no PNAC-2004, com base nos indicadores referidos na alínea precedente;
b) Um mecanismo que permita a proposta periódica à Comissão para as Alterações Climáticas de medidas suplementares ao PNAC-2004 que possam precaver eventuais situações de incumprimento do Protocolo de Quioto por parte de Portugal.
5 – Atribuir à Comissão para as Alterações Climáticas a responsabilidade de preparar o contributo nacional para o debate pelo Conselho Europeu da Primavera de 2005 das estratégias e metas a médio e longo prazos no domínio da estabilização das concentrações de gases com efeito de estufa na atmosfera, incluindo a análise de programas de redução de emissões a partir de 2012.
6 – Estabelecer a data de 31 de Agosto de 2004 para ser apresentada à Comissão para as Alterações Climáticas, pelo grupo de trabalho para a elaboração do PNALE, constituído pelo despacho conjunto n.º 1093/2003, de 13 de Dezembro, uma proposta de directrizes para a utilização de créditos de mecanismo de desenvolvimento limpo e implementação conjunta, bem como uma proposta das respectivas implicações orçamentais.
Presidência do Conselho de Ministros, 15 de Junho de 2004. – O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.
ANEXO
Relatório síntese do Programa Nacional para as Alterações Climáticas
1 Sumário
O presente documento apresenta o conjunto de propostas de medidas adicionais do Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC), medidas essas que o Governo vem preparando com o objectivo de garantir o cumprimento por parte de Portugal dos seus compromissos no âmbito do Protocolo de Quioto sobre Alterações Climáticas (PQ) e do Acordo de Partilha de Responsabilidades da União Europeia (UE).
A alteração do clima da Terra e os seus efeitos negativos são uma preocupação comum da humanidade. De acordo com os sucessivos relatórios de avaliação do painel intergovernamental para as alterações climáticas, em particular o terceiro relatório, de 2001, as actividades humanas contribuíram para um aumento substancial das concentrações de gases com efeito de estufa (GEE) na atmosfera, causando, em acréscimo ao efeito de estufa natural, um aquecimento médio adicional da superfície da Terra e da atmosfera, facto que poderá afectar adversamente os ecossistemas naturais e a humanidade.
Para dar resposta a esta ameaça global, quase duas centenas de Estados, entre os quais Portugal, ratificaram a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (CQNUAC), assinada em 1992 na Cimeira da Terra no Rio de Janeiro.
A CQNUAC elege como objectivo a estabilização das concentrações na atmosfera de GEE a um nível que evite uma interferência antropogénica perigosa com o sistema climático. Tal nível deverá ser atingido durante um espaço de tempo suficiente para permitir a adaptação natural dos ecossistemas às alterações climáticas, para garantir que a produção de alimentos não seja ameaçada e para permitir que o desenvolvimento económico prossiga de uma forma sustentável.
Em 1997, a comunidade internacional adoptou o Protocolo de Quioto, com vista a garantir o combate efectivo às alterações climáticas através do estabelecimento de compromissos quantificados de limitação ou redução das emissões dos seis principais GEE por si regulados e tendo em vista uma redução global, até 2012, a níveis, pelo menos, 5% abaixo dos níveis de 1990.
Nos termos do Protocolo de Quioto, é permitido que a Comunidade Europeia e os seus Estados membros cumpram em conjunto os seus compromissos. Foi assim estabelecida uma meta de redução global de 8% das emissões de GEE para a Comunidade Europeia, sendo definidas, ao abrigo do compromisso comunitário de partilha de responsabilidades, metas diferenciadas para cada um dos Estados membros. Neste âmbito, Portugal obrigou-se a limitar o aumento das suas emissões a 27% relativamente aos valores de 1990.
Portugal aprovou o Protocolo de Quioto em Março de 2002 (através do Decreto n.º 7/2002, de 25 de Março), e a Comunidade Europeia, em Abril desse mesmo ano, veio formalizar o compromisso comunitário com a aprovação do Protocolo e do acordo de partilha de responsabilidades entre os Estados membros (através da Decisão n.º 2002/358/CE, de 25 de Abril, do Conselho).
Para além do desenvolvimento de políticas e medidas nacionais, o Protocolo de Quioto prevê três mecanismos de mercado para atingir o objectivo global de redução: o comércio internacional de emissões, a implementação conjunta e o mecanismo de desenvolvimento limpo.
A Comunidade Europeia e os Estados membros têm desenvolvido os seus próprios esforços no combate às alterações climáticas, no seguimento da CQNUAC e do Protocolo de Quioto. O Programa Europeu para as Alterações Climáticas [COM (2000) 88, final] estudou e apresentou políticas e medidas comunitárias orientadas para a redução de emissões provenientes de fontes específicas.
Em 2000, o Livro Verde sobre o Comércio de Licenças de Emissão [COM (2000) 87] lançou o debate sobre a conveniência e o possível funcionamento do comércio de licenças de emissão de GEE na Europa, dando início a um processo que culminou com a adopção da Directiva n.º 2003/87/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro. A referida directiva destina-se a contribuir para o cumprimento mais eficaz dos compromissos da União Europeia e dos seus Estados membros, através da implementação de um mercado europeu de licenças de emissão de GEE que seja eficiente do ponto de vista económico e, ao mesmo tempo, garanta os objectivos ambientais a que se propõe. Estima-se que o regime comunitário de comércio de licenças de emissão de GEE venha a abarcar 46% do total das emissões de dióxido de carbono na União Europeia e várias dezenas de milhar de instalações.
Recentemente, foi aprovada a directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva n.º 2003/87/CE, de 13 de Outubro, que visa ligar o comércio comunitário de licenças de emissão de GEE com os mecanismos de projecto do Protocolo de Quioto (implementação conjunta e mecanismo de desenvolvimento limpo). A introdução de licenças provenientes dos mecanismos de projecto do Protocolo de Quioto no comércio de emissões comunitário irá contribuir para o aumento da eficiência económica do mercado europeu através do aumento da sua liquidez, bem como, no que ao mecanismo de desenvolvimento limpo diz respeito, permitirá ligar o mercado europeu de emissões com as políticas de combate às alterações climáticas dos países em desenvolvimento. Esta relação afigura-se fundamental numa estratégia global de médio e longo prazos em matéria de alterações climáticas.
A União Europeia iniciou, aliás, recentemente, a preparação de estratégias e metas a médio e longo prazos no domínio da redução das emissões, com vista a uma análise por parte do Conselho Europeu da Primavera em 2005. Nesse contexto, será obviamente fundamental ter em conta as circunstâncias presentes e as tendências futuras do combate mundial às alterações climáticas, na liderança do qual a União Europeia e os seus Estados membros estão empenhados.
Estratégias e metas futuras deverão, necessariamente, ter em conta as posições dos principais parceiros internacionais da União Europeia, nomeadamente a Rússia, os Estados Unidos e os países em vias de desenvolvimento.
Ao nível da União Europeia, estas estratégias e metas a médio e longo prazos deverão ter em conta vários aspectos complementares, nomeadamente:
i) A análise de outras formas mais rentáveis de controlar as emissões de gases com efeito de estufa, nomeadamente ao nível de tecnologias mais eficientes do ponto de vista energético e que permitam uma progressiva redução do conteúdo de carbono dos produtos das economias;
ii) A análise dos custos potenciais da inacção em matéria de combate às alterações climáticas, nomeadamente no respeitante a impactes sócio-económicos e biofísicos, bem como a necessidade de ter em conta a adaptação a esses impactes;
iii) Sem pôr em causa o empenho da União Europeia na concretização do objectivo do Protocolo de Quioto, a análise de mecanismos e instrumentos complementares que potenciem a efectiva participação global no combate às alterações climáticas;
iv) A análise das implicações ambientais e ao nível da competitividade das estratégias e metas de médio e longo prazos, bem como a necessária ponderação da divisão da responsabilidade intracomunitária nesse horizonte temporal.
Ao nível nacional, tem-se igualmente dado resposta ao problema das alterações climáticas e aos compromissos internacionalmente assumidos. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/98, de 29 de Junho, criou a Comissão para as Alterações Climáticas (CAC), de carácter interministerial, incumbindo-a de elaborar a estratégia nacional para as alterações climáticas e acompanhar, a nível interno e internacional, a tomada de decisões e execução de políticas e medidas nesta matéria.
No cumprimento do seu mandato, a CAC elaborou a estratégia nacional para as alterações climáticas (aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 59/2001, de 30 de Maio), reiterando os compromissos internacionais, nomeadamente o cumprimento do objectivo de redução das emissões.
O PNAC foi elaborado no seio da CAC e a sua primeira versão foi apresentada a discussão pública em 2002. Em Dezembro de 2003, a CAC aprovou as medidas adicionais do PNAC, que foram igualmente objecto de discussão pública.
O regime do comércio europeu de emissões foi entretanto objecto de elaboração no nosso país através da elaboração da proposta de programa nacional de atribuição de licenças de emissão (PNALE) para o período experimental da directiva de 2005 a 2007. O mercado europeu de emissões permite criar as condições para que as instalações nacionais abrangidas possam utilizar este mecanismo de mercado como a sua contribuição para o esforço nacional de mitigação das emissões de gases com efeito de estufa.
Neste contexto, bem como na perspectiva mais vasta da definição das políticas e medidas nacionais de combate às alterações climáticas, é fundamental que o Governo aprove o PNAC na sua versão de 2004, que estabiliza um cenário de cumprimento dos objectivos nacionais contidos no Protocolo de Quioto e que inclui uma estimativa rigorosa da evolução das emissões nacionais de gases com efeito de estufa até 2012, bem como políticas e medidas que permitem, por um lado, perspectivar com maior segurança o futuro e, por outro, desenvolver mecanismos e instrumentos de concretização dessas políticas e medidas no horizonte de cumprimento de Quioto.
Importa, por isso, em particular, continuar a definição dos instrumentos económico-financeiros do PNAC, nomeadamente a tributação sobre o carbono, e a definição dos meios financeiros adequados à participação nacional nos mecanismos de projecto do Protocolo de Quioto.
Quanto a estes últimos – mecanismo de desenvolvimento limpo e implementação conjunta -, importa definir a arquitectura institucional de acompanhamento e o enquadramento orçamental a médio prazo, com início já em 2005. Tem sido este o caminho seguido pelos restantes Estados membros, numa perspectiva de posicionamento atempado no mercado internacional, através de obtenção de créditos de emissão a preços custo eficientes. Por outro lado, várias instituições financeiras internacionais – como o Banco Mundial, o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento e o Banco Europeu de Investimento – estão a ultimar estratégias e instrumentos relativos ao emergente mercado global de carbono, sendo essencial, neste contexto, que Portugal possa participar de forma estruturada.
Como foi referido, durante a segunda metade de 2002 e a primeira metade de 2003, o Governo elaborou e desenvolveu a análise sobre a situação de referência das emissões nacionais de gases com efeito de estufa (GEE) em 1990 e a sua estimativa para 2010, constituindo esse trabalho o cenário de referência das emissões nacionais de GEE (ver nota 1).
Neste contexto, a cenarização efectuada sobre a evolução da economia nacional até 2010, num cenário business as usual (ou seja, sem medidas de redução), reflecte uma necessidade crescente de consumo de energia, a qual resulta num aumento de 54% a 63% de emissões de GEE em 2010, face ao ano de referência de 1990. Este acréscimo implica uma necessidade de redução de 16 Mt (megatoneladas) a 21 Mt de CO(índice 2)e (dióxido de carbono equivalente), por forma a cumprir os compromissos assumidos por Portugal de crescimento das emissões de GEE de 27% naquele período, nos termos do referido Acordo de Partilha de Responsabilidade da União Europeia.
Contribuem para assegurar o cumprimento desses compromissos de redução e controlo de emissões de GEE as medidas em vigor, incorporadas no cenário de referência, as medidas adicionais do PNAC, aqui apresentadas, e o comércio europeu de licenças de emissão (CELE), que entrará em vigor em 1 de Janeiro de 2005. Para além destas políticas e medidas (PeM), deve ainda equacionar-se a necessidade de recorrer aos mecanismos de flexibilidade estabelecidos no Protocolo de Quioto (comércio internacional de emissões, implementação conjunta e mecanismo de desenvolvimento limpo).
Espera-se que o conjunto das medidas incluídas no cenário de referência permita reduzir de 7,6 Mt a 8,8 Mt de CO(elevado a 2)e no período 2008-2012, face ao cenário business as usual.
As medidas adicionais aqui apresentadas deverão ainda ser especificadas em termos da sua inserção e coerência – numa perspectiva transversal – com as políticas definidas e a definir pelo Governo. Naturalmente, esta especificação deverá determinar o seu impacte, eficiência e eficácia em termos económicos e ambientais, num quadro dinâmico de implementação do PNAC.
Não obstante, com a actual configuração das medidas adicionais, é possível esperar-se uma redução potencial de 6,7 Mt a 7 Mt de CO(índice 2)e.
Partindo do pressuposto do cumprimento total da eficácia das medidas contidas no cenário de referência e adicionais, constata-se que não é possível atingir os níveis de emissão de GEE por forma a cumprir o objectivo nacional estabelecido no seio da UE e inscrito no PQ. De facto, depois da redução esperada pelas medidas contidas no cenário de referência e adicionais, torna-se necessária uma redução suplementar de 1,7 Mt a 5,6 Mt de CO(índice 2)e.
Para tal, como foi referido, será necessário desenvolver os mecanismos nacionais de participação nos mecanismos de flexibilidade previstos no PQ, como sejam o comércio internacional de emissões, a implementação conjunta e o mecanismo de desenvolvimento limpo.
Importa também explicitar a forma como se lidará com a incerteza associada à eficácia ambiental das medidas e acções contidas no cenário de referência e adicionais. Assim, a primeira abordagem deve assentar num sistema robusto e responsável de monitorização da sua execução, para o que é necessário definir o quadro operacional e de responsabilidade. A segunda abordagem deve considerar a preparação de um conjunto de medidas de emergência, a adoptar no início de 2008, caso se constate um afastamento significativo da linha de cumprimento.
A aprovação na Comissão para as Alterações Climáticas das medidas adicionais para discussão pública constantes deste documento constituiu o primeiro de três momentos chave para a conclusão do PNAC, com vista à sua efectiva implementação.
O segundo momento coincidiu com a conclusão do Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão (PNALE), ao abrigo da directiva europeia sobre comércio de emissões, recentemente aprovada. Com o PNALE, conhecemos com rigor as emissões cobertas pela directiva e saberemos com precisão o esforço adicional que irá ser requerido a Portugal para cumprir Quioto.
O terceiro momento consiste na definição dos instrumentos económico-financeiros do PNAC que se encontram em discussão no seio do Governo e que se traduzem, na sua essência, na consagração de uma taxa sobre a emissão de carbono, de acordo com o já previsto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, de 28 de Abril, e da definição da participação nacional nos restantes mecanismos de mercado previstos no Protocolo de Quioto.
É assim possível ao Governo aprovar o PNAC em 2004, por forma que o conjunto de instrumentos de política ainda não aprovados até esta data possam ser implementados a partir de 2005.
2 Introdução
De acordo com os resultados estimados para o cenário de referência, para cumprir com as responsabilidades assumidas no âmbito do Protocolo de Quioto (PQ) e do acordo de partilha de responsabilidade da União Europeia (UE), Portugal (continental e Regiões Autónomas) tem de efectuar um esforço de controlo e redução das suas emissões de gases com efeito de estufa (GEE), até ao horizonte do primeiro período de cumprimento (2012), entre 8,6 Mt e 12,6 Mt de CO(índice 2)e, nos cenários baixo e alto, respectivamente.
Por forma a acomodar os objectivos de controlo de emissões de GEE, o Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) deve integrar medidas e instrumentos nacionais adicionais face aos considerados no âmbito do cenário de referência. Estas medidas e instrumentos nacionais deverão ser articulados com:
i) Os instrumentos de política comunitária para as alterações climáticas, nomeadamente o comércio europeu de licenças de emissão (Directiva n.º 2003/87/CE, do Parlamento e do Conselho, de 13 de Outubro);
ii) O recurso aos mecanismos de mercado preconizados no âmbito do PQ (comércio internacional de direitos de emissão, implementação conjunta e mecanismo de desenvolvimento limpo).
A identificação das medidas adicionais propostas considerou esta articulação, assim como a aplicação de três critérios basilares, a saber: eficácia ambiental, eficiência económica (estática e dinâmica) e equidade no esforço nacional de redução de emissões entre os sectores e agentes económicos portugueses.
O presente documento integra-se no âmbito dos trabalhos técnicos preparatórios do PNAC e constitui-se como uma peça dessa mesma estratégia ao equacionar um conjunto de medidas e instrumentos (nacionais) directamente vocacionado para a redução do balanço líquido das emissões nacionais de GEE, a implementar pelos diferentes sectores e agentes de actividade económica.
As medidas e instrumentos equacionados são adicionais às medidas e instrumentos de política em vigor até ao horizonte do primeiro período de cumprimento (2008-2012), que integram o cenário de referência. Deve, no entanto, salientar-se que, para o cumprimento dos objectivos de redução de emissões de GEE, se revela essencial concretizar de forma plena o potencial de eficácia ambiental estimado para os instrumentos de política contidos no cenário de referência.
A configuração final do PNAC, após aprovação pelo Governo em 2004, requer por isso um quadro de monitorização, no âmbito do qual deve ser concretizada a sua formulação técnica (que variáveis devem ser monitorizadas e quando devem ser monitorizadas) e de responsabilidade (quem monitoriza).
A identificação e proposta(s) de arquitectura das medidas adicionais realizou-se na observância dos princípios explicitados no PNAC 2001:
Adoptar uma resposta nacional positiva e construtiva face aos compromissos nacionais de redução de emissões de GEE, promovendo um conjunto de medidas e instrumentos integrados, coerentes e eficientes, que salvaguarde e, sempre que possível, reforce outros objectivos de política ambiental e sectorial e a competitividade da economia portuguesa;
Aplicar o princípio do poluidor-pagador/utilizador-pagador;
Envolver o conjunto de sectores e agentes económicos no esforço nacional de redução de emissões de GEE;
Adoptar uma perspectiva de médio-longo prazo, atendendo, inclusivamente, aos objectivos para além do primeiro período de cumprimento (pós-2012).
No capítulo seguinte explicita-se a abordagem metodológica adoptada na definição do âmbito do presente documento, seguindo-se a apresentação sistemática, no capítulo 4, das medidas (e instrumentos) adicionais para os diferentes agentes sectoriais abrangidos e o respectivo potencial em termos de redução das emissões de GEE. No capítulo 5 são apresentadas considerações quanto à monitorização da implementação do PNAC. Após as considerações finais, e constituindo os anexos do presente relatório, são detalhadamente descritas cada uma das medidas adicionais propostas.
3 – Abordagem metodológica
3.1 – Enquadramento das medidas adicionais no PNAC
A identificação e definição das medidas e instrumentos (adicionais) que integram o PNAC deve realizar-se em conformidade e de forma coerente e integrada com as medidas e instrumentos contidos no Programa Europeu para as Alterações Climáticas (PEAC). Muitas dessas medidas, nomeadamente as apresentadas na comunicação relativa à primeira fase de implementação do Programa [COM (2001) 580], como a promoção da produção de electricidade a partir de fontes renováveis de energia, já se encontram contidas no cenário de referência.
No que se refere aos instrumentos de política, o PEAC aconselha à adopção, por parte de cada Estado membro (EM), de pacotes de instrumentos flexíveis, que privilegiem as abordagens pelo mercado e a efectivação directa do princípio do poluidor-pagador, complementados por instrumentos de carácter voluntário (por exemplo, acordos voluntários) e de informação.
Concomitantemente, e por forma a minimizar os custos da estratégia europeia de cumprimento do Protocolo de Quioto, a UE adoptou recentemente a directiva sobre o comércio de licenças de emissão de GEE à escala europeia. Por conseguinte, a estratégia nacional com vista à redução das emissões de GEE tem, obrigatoriamente, de integrar este instrumento de política comunitária.
A figura 1 ilustra a articulação necessária entre o PNAC, o comércio europeu de licenças de emissão e os mecanismos de flexibilidade do PQ, bem como a forma de articulação entre as políticas e medidas adicionais, com o domínio definido no presente documento, e todas as outras já existentes e ou a equacionar.
(ver figura no documento original)
De acordo com a referida Directiva n.º 2003/87/CE, de 13 de Outubro, a partir de Janeiro de 2005, em cada EM, ficam sujeitos ao comércio europeu de licenças de emissão de GEE todos os sectores – instalações – cujas actividades se encontram listadas no seu anexo I (ver nota 2). No âmbito do presente trabalho, esta especificação induz, desde logo, à distinção entre os sectores de actividade económica sob comércio de emissões e os outros sectores, na medida em que cada um destes subgrupos deve ser alvo de tratamento diferenciado. Assim, deve atender-se aos seguintes pontos:
a) O esforço de controlo e redução de emissões de GEE dos agentes sectoriais abrangidos pelo mercado europeu de direitos de emissão, nos períodos 2005-2007 (primeira fase de mercado) e 2008-2012, será definido no âmbito do Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão (PNALE), a definir pela(s) autoridade(s) competente(s) do País (ver nota 3). No primeiro período de mercado, O PNALE imporá um tecto de emissão de CO(índice 2) num primeiro momento ao País e, num segundo momento, a cada uma das instalações abrangidas.
A elaboração do PNALE – em desenvolvimento – deve atender a um conjunto de critérios, nomeadamente os explicitados no anexo III da directiva. Não obstante, é essencial que a mesma seja efectuada na observância e respeito dos princípios do PNAC e que os critérios efectivamente utilizados sejam coerentes com os assumidos no âmbito mais lato da estratégia nacional de controlo e redução de emissões de GEE contida no PNAC;
b) Decorre da alínea a) o âmbito de intervenção do presente trabalho, de acordo com o qual ficam sujeitos a medidas e instrumentos adicionais todos os outros sectores, ou seja, os agentes sectoriais não abrangidos pelo mercado de emissões, entre os quais se destacam os dos seguintes sectores: transportes, doméstico e serviços, agricultura e pecuária, floresta, resíduos, f-gases e alguns subsectores industriais (exemplo: têxteis, agro-alimentares, cerâmica e químicas).
A definição destas medidas e instrumentos considera o potencial esforço de redução de emissões a ser exigido aos agentes sectoriais sob comércio de emissões e o seu peso relativo no balanço nacional de emissões de GEE, a fim de garantir um tratamento justo e não discriminatório entre os sectores e agentes que contribuem para as emissões de GEE, e a aplicação transversal do princípio do poluidor/utilizador-pagador.
Em termos gerais, o conteúdo do presente documento integra, para cada um dos outros sectores, a explicitação da(s) medida(s) adicional(is) a implementar, bem como dos respectivos instrumentos e acções, e os resultados da sua análise, como o potencial de redução de emissões de GEE e, sempre que possível, a relação custo-eficácia (ou custos de investimento).
A arquitectura do conjunto de medidas e instrumentos adicionais equacionados considera: i) o enquadramento de política e económico-conjuntural, para definição das medidas e instrumentos adicionais de curto prazo, e ii) as tendências e orientações estratégicas de política nacional, ibérica e europeia (UE), para definição das medidas e instrumentos de médio e longo prazos. As tarefas a empreender no seu âmbito integram a explicitação, no tempo, das fases de concepção/desenvolvimento, implementação e monitorização das medidas e dos respectivos instrumentos e acções.
3.2 – Necessidade de medidas adicionais
Nesta secção é apresentada a evolução das emissões de GEE dos diferentes sectores de actividade (figuras 2 e 3), assim como o seu esforço de redução devido à implementação das PeM previstas no cenário de referência do PNAC. Assumindo a implementação total das PeM do cenário de referência, verifica-se que entre 1990 e 2010 as emissões de GEE nacionais aumentam cerca 24,8 Mt a 28,8 Mt de CO(índice 2)eq, a que corresponde um aumento de 41% a 48%.
(ver figura no documento original)
O consumo de energia no sector residencial e serviços é a actividade responsável pelo maior aumento percentual das emissões de GEE (em 2010 prevê-se que as emissões deste sector aumentem 126% a 135% face ao valor de 1990). Não obstante, a contribuição mais significativa em termos de volume de emissões deve-se ao sector dos transportes, com um aumento das emissões em 2010 superior a 100% em qualquer dos cenários.
(ver figura no documento original)
No quadro n.º 1 encontram-se representadas as PeM do cenário de referência. Pode constatar-se que o sector da oferta da energia é responsável pela maioria da redução de emissões, com cerca de 50% da redução total esperada no âmbito do cenário de referência, devida à produção de electricidade por fontes renováveis. É de salientar igualmente a contribuição dos transportes, principalmente devido à implementação da Directiva de Biocombustíveis. A redução esperada da indústria justifica-se pelo pressuposto assumido na cenarização relativo à melhoria esperada da eficiência energética dos processos produtivos.
Como se constata, a eficácia ambiental do total das PeM consideradas em cenário de referência tem uma importância crucial para o cumprimento do compromisso assumido por Portugal, representando 41% a 47% do esforço de redução face ao cenário business as usual, no ano de 2010.
QUADRO N.º 1
Síntese de medidas propostas para o cenário de referência
(ver quadro no documento original)
4 – Medidas adicionais propostas
4.1 – Síntese das medidas adicionais
As medidas adicionais propostas, na sua grande maioria, resultam da análise das experiências de diversos países e, como tal, apresentam alguma robustez por já ter sido testada a sua implementação, embora noutro contexto sócio-económico. Na formulação das medidas aqui apresentadas utilizaram-se essas experiências para definir a melhor forma de adaptação à situação nacional.
No quadro n.º 2 é apresentada uma descrição sucinta das medidas adicionais propostas. Nos anexos do presente documento pode ser encontrada a descrição detalhada das mesmas. Por forma a possibilitar uma visão integrada do panorama traçado pelas medidas adicionais no âmbito do PNAC, é ainda apresentado um cronograma da implementação dessas mesmas medidas.
A taxa sobre a emissão de carbono, prevista na Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, de 28 de Abril, sobre a política energética portuguesa, e que se encontra em discussão interministerial, assume-se como um instrumento de grande relevância no quadro de uma política de utilização racional de energia e de uma política de mitigação das emissões de gases com efeito de estufa, uma e outra intimamente relacionadas. Tal relevância advém do facto de se tratar de um instrumento horizontal, de grande alcance ao nível da flexibilidade para a definição de instrumentos de política energética, susceptível de abarcar a generalidade dos sectores da economia.
Com efeito, tal como refere a política energética portuguesa, a taxa sobre a emissão de carbono visa, entre outros objectivos:
i) Garantir a equidade inter e intra-sectorial no esforço de redução de emissões de gases com efeito de estufa;
ii) O envio de sinais aos consumidores de energia para a alteração de padrões de consumo;
iii) O funcionamento como cobertura para os acordos voluntários com a indústria para a utilização racional de energia;
iv) A arrecadação de meios que financiem a estratégia a definir pelo Governo no que se refere à utilização dos mecanismos de flexibilidade do Protocolo de Quioto, à promoção de políticas energéticas e ambientais tendentes a promover a utilização racional de energia e a redução de emissões de gases com efeito de estufa.
A arquitectura da taxa de carbono e a sua articulação com outros instrumentos não está ainda completamente definida, devendo emergir como resultado da reflexão empreendida actualmente no seio do Governo. As características do sistema fiscal português aconselham a operacionalização desta taxa em articulação com o imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) e tendo em conta a directiva sobre a tributação mínima dos produtos energéticos recentemente aprovada. Deverá ainda prever um regime de redução ou isenção para as empresas que adiram a um acordo voluntário de racionalização dos consumos de energia. Esses acordos entre o Estado e as empresas deverão vincular os seus signatários a metas de eficiência energética e de redução de emissões de GEE, calendarizadas no tempo.
QUADRO N.º 2
Síntese das medidas adicionais propostas
(ver quadro no documento original)
4.2 – Contribuição das medidas adicionais para a redução de GEE
Nesta fase, só é possível quantificar a eficácia ambiental das medidas adicionais propostas para os sectores dos transportes, florestas, agricultura e oferta de energia. Da análise da figura 4, relativa ao cenário alto, evidencia-se a grande contribuição esperada dos transportes, com quase 50% da redução.
(ver figura no documento original)
No quadro n.º 3 apresentam-se indicadores percentuais relativos à contribuição sectorial (e por medida adicional) para a redução de emissões de GEE, comparativamente à sua contribuição para o balanço nacional de emissões de GEE, em 2010, no cenário de referência. É de salientar a participação esperada do sector dos transportes, que, devido essencialmente às medidas destinadas a melhorar a eficiência energética do transporte individual e desincentivar a sua utilização, contribui com cerca de 40% do esforço de redução associada ao total de medidas adicionais.
QUADRO N.º 3
Esforço de redução sectorial devido às medidas adicionais propostas e contribuição de cada sector para as emissões de GEE nacionais em 2010.
(ver quadro no documento original)
Nota. – As emissões em 2010 do cenário de referência aqui consideradas não incluem as reduções devido à floresta e alterações do uso do solo. Enquanto a contribuição percentual das medidas adicionais de cada sector para a diminuição do esforço de redução considera as sinergias entre as medidas aplicáveis ao sector da oferta de energia, o mesmo não acontece com a contribuição percentual de cada medida (de outra forma, a soma da contribuição de cada medida excede os 100%).
Na figura 5 apresentam-se as reduções esperadas de cada uma das medidas consideradas individualmente. Verifica-se que cada sector apresenta pelo menos uma medida cuja contribuição é fundamental para a redução nacional, mostrando o critério de equidade de redução assumido como um dos princípios basilares do PNAC. Note-se, por exemplo, a valorização de resíduos da pecuária, na produção de electricidade a partir de energias renováveis, no desincentivo ao transporte individual e no papel de sumidouro da floresta.
(ver figura no documento original)
Não obstante o esforço de redução associado quer ao cenário de referência quer ao conjunto de medidas adicionais, não é possível cumprir o objectivo de redução acordado no seio da UE. Como se constata das figuras 6 e 7, é ainda necessário reduzir cerca de 1,7 Mt a 5,6 Mt de CO(índice 2)eq. Este valor deve ser encarado com a cautela associada ao grau de incerteza inerente à implementação das medidas do cenário de referência, assim como as medidas adicionais.
(ver figuras no documento original)
5 Monitorização
Como já referido anteriormente, grande parte do sucesso da estratégia de descarbonização da economia portuguesa assenta no pressuposto da eficácia ambiental esperada das políticas e medidas em vigor (consideradas no cenário de referência) e adicionais.
Surge assim como crucial o desenvolvimento de uma forte componente de monitorização da implementação das medidas e acções identificadas, bem como da sua eficácia, com um duplo objectivo: i) identificar situações de necessidade de aplicação de sanções (enforcement), nomeadamente através de esquemas de informação activa, e ii) identificar a necessidade de elaboração atempada de medidas e acções de emergência, a entrar em vigor no início de 2008.
Nesta secção é apresentado um quadro de monitorização do PNAC. Os elementos aqui considerados seguem de muito perto o que já foi proposto para a monitorização do Programa para os Tectos de Emissão Nacionais, na medida em que se considera que o modelo conceptual sugerido é em tudo semelhante, e até complementar, ao que deverá ser adoptado no âmbito do PNAC.
5.1 Enquadramento
A monitorização de políticas e medidas (PeM), sejam ambientais, energéticas, económicas ou sociais, é feita usualmente de uma forma indirecta através do uso de indicadores finais, de que são exemplo as emissões de poluentes, as taxas de reciclagem, o consumo de electricidade, a importação de combustíveis fósseis, a taxa de desemprego ou o PIB per capita. Grosso modo, estes indicadores traduzem o resultado da cadeia completa das PeM, desde a sua formulação e concepção até à sua implementação e execução.
A monitorização da execução de determinada(s) PeM é uma tarefa que tem vindo a ganhar importância crescente, dada a necessidade de prestação de informação do actual funcionamento das sociedades, principalmente devido ao esquema de cooperação multilateral e funcionamento conjunto dos Estados (por exemplo Pacto de Estabilidade e Crescimento, protocolos ambientais multilaterais).
Embora se saiba que os níveis de valores daqueles indicadores, ou a sua alteração (medida como taxas de variação), tenham como causa a adopção (passiva ou activa) de uma determinada PeM, a verdade é que, para muitos casos, a complexidade da implementação e execução de uma certa PeM não a permite associar com clareza aos indicadores respectivos. Salientam-se três tipos de razões para esta limitação, ou mesmo impossibilidade:
Atraso temporal entre a implementação e execução de uma PeM e os efeitos esperados, medidos por aquele tipo de indicadores, facto que leva a pôr em causa a adequabilidade dos indicadores usados;
Grande variabilidade dos comportamentos dos múltiplos agentes envolvidos na implementação e execução de PeM (por exemplo Administração Pública, empresas, consumidores), por vezes com efeitos opostos entre si, e opostos ao esperado antecipadamente pela PeM definida;
Escala temporal entre a adopção de uma PeM e a sua execução, sendo usualmente grande, principalmente quando a PeM exige alterações estruturais (por exemplo alteração tecnológica de um processo de produção, alteração de comportamentos dos agentes, adopção de novas práticas públicas).
O sistema de monitorização nacional, assente num conjunto de estatísticas produzidas por diversas fontes, e construídas com objectivo diverso do da monitorização da execução de PeM, não assegura nem responde à necessidade de avaliar o sucesso/insucesso das PeM do cenário de referência, e que irão resultar num impacte positivo no balanço nacional de emissões de GEE.
Do que tem sido apresentado no presente documento, podemos afirmar:
O cumprimento dos compromissos de controlo e redução de GEE depende, em absoluto, da execução plena dos instrumentos de política que integram o cenário de referência do PNAC.
O protagonismo dos instrumentos do cenário de referência na redução das emissões nacionais de GEE (30,4% a 35,1% do esforço de redução nacional para o cenário alto e baixo, respectivamente) obriga à sua monitorização, em tempo útil, com o objectivo de se avaliar o grau da sua execução, e consequentemente da redução esperada de emissões, e antever o grau de (in)cumprimento associado.
Esta matéria é tanto mais importante quanto o PNAC é um programa transversal a toda a economia portuguesa e, para muitos sectores, estrutural pelas alterações que induz.
5.2 – Modelo conceptual
O sistema de monitorização do PNAC deve incluir, basicamente, duas componentes:
a) Emissões de GEE;
b) Execução das PeM concretizadas no PNAC (cenário de referência e medidas adicionais).
O sistema de monitorização das emissões de GEE deve obedecer, desde logo, ao disposto no Protocolo de Quioto, que é assegurado pelo Instituto do Ambiente, através da elaboração anual dos inventários nacionais reportados a instituições europeias, nomeadamente à Comissão Europeia e à Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC), e que, a curto prazo, deve assentar plenamente no designado sistema nacional (artigo 5.º do PQ). A produção de inventários nacionais de emissões de GEE de acordo com as directrizes do sistema nacional aprovado pela 7.ª Conferência das Partes da UNFCCC tem vindo a ser progressivamente desenvolvido e melhorado, nomeadamente no que se refere à estabilização de metodologias de estimativa de emissões, factores de emissão e práticas de recolha de variáveis de actividade dos diversos sectores.
A monitorização da execução das PeM é aqui objecto de análise. O processo de concepção-implementação-execução de PeM e respectivos instrumentos implica uma cadeia de agentes que, na generalidade, integra o sector público, o sector privado e os consumidores/cidadãos, organizados num modelo conceptual que é apresentado na figura 8.
(ver figura no documento original)
A principal motivação, interesse e necessidade da monitorização da execução de PeM no quadro de um programa transversal como o PNAC, alicerçado em obrigações de cumprimento, é assegurar o conhecimento atempado sobre o impacte esperado das PeM no balanço nacional de emissões. A informação decorrente de um sistema de monitorização deve servir, sobretudo, para identificar, em tempo útil, lacunas e ineficiências na execução das PeM por parte dos agentes. Uma tarefa subsidiária a este conhecimento é a identificação das causas de tais lacunas e a respectiva actuação, por parte da governance pública, no sentido de ajustamentos de política e instrumentos.
5.3 Objectivos
Qualquer sistema de monitorização de PeM deve responder a três objectivos primários (ver nota 6):
Deve ser informativo sobre as condições de execução das políticas e adopção dos instrumentos. Assim, deve fornecer informação sobre: a) execução actual (por exemplo: capacidade instalada de produção de electricidade por fonte renovável); b) expectativa de execução (por exemplo: número de licenças concedidas para produção de electricidade a partir de fonte renovável), e c) tempo esperado de execução (por exemplo: dois anos).
O sistema de monitorização deve avisar, antecipadamente, situações futuras. Só com esta característica é possível desenhar e empreender mecanismos de reacção e ajustamentos que permitam ter resultados em tempo útil (leia-se ano de cumprimento);
Deve ser inteligente, na medida em que permite a identificação das causas das ineficiências e lacunas e a sugestão de respostas adequadas da parte dos agentes;
Deve ser aberto e interactivo, permitindo aos agentes (stakeholders): a) obter consenso para os problemas identificados, nomeadamente sobre as suas causas e soluções, e b) atribuir responsabilidades para a implementação das soluções acordadas.
5.4 – Componentes do sistema
Por forma a atingir estes objectivos, um sistema de monitorização requer três componentes:
a) Formal – modelo institucional que assegura a participação efectiva dos diversos agentes produtores de informação relevante para o sistema. Esta componente deve: a) estabelecer o quadro de responsabilidades dos agentes produtores de informação relativa às variáveis de monitorização da execução de PeM; b) gerir a recolha, organização e análise das variáveis de monitorização; c) manter e operar o modelo analítico, quando existente, para a produção de variáveis de monitorização, e d) aprovisionar o acesso à informação dos diversos agentes. Para tal, deverá utilizar-se o quadro formal previsto nas directrizes do sistema nacional aprovado pela 7.ª Conferência das Partes da UNFCCC para a monitorização das emissões de GEE;
b) Operacional – designa o conjunto de variáveis ou indicadores de monitorização e metodologias para a sua elaboração e sistematização. A selecção e escolha das variáveis deve ser orientada para a avaliação da execução de PeM, num determinado momento no tempo, de uma forma directa [grau de execução face ao objectivo (ver nota 7) proposto] ou indirecta (perspectiva do grau de execução no tempo face ao objectivo proposto). Idealmente, o conjunto de variáveis, bem como o modelo analítico para a sua gestão, deve ser escolhido por forma a fornecer avisos sobre ineficiências e insucessos, e a detectar as causas possíveis;
c) Divulgação – práticas de reporte e disseminação. São vários os modelos de disseminação de um sistema de monitorização, desde o acesso directo electrónico, generalizado ou restrito, à produção de relatórios específicos divulgados a grupos de agentes intervenientes numa determinada PeM.
O sistema de monitorização deverá estar delineado até ao final de 2004, devendo a avaliação de resultados ocorrer em três momentos no tempo:
2005-2006: com vista a demonstrar progresso nos termos do PQ;
2008: coincidente com o início do primeiro período de cumprimento do PQ (2008-2012); e
2010: coincidente o terceiro dos cinco anos com o período de cumprimento do PQ.
6 – Considerações finais
1 – A cenarização efectuada sobre a evolução da economia nacional até 2010, num cenário business as usual, reflecte uma necessidade crescente de consumo de energia e respectivas emissões de GEE. Este cenário resulta num aumento de 54% a 63% de emissões de GEE em 2010, face ao ano de referência de 1990. Tendo em conta os valores acordados, no seio do Acordo de Partilha de Responsabilidade da União Europeia, de crescimento das emissões de GEE de 27% naquele período, conclui-se pela necessidade de redução de 16 Mt a 21 Mt de CO(índice 2)e.
2 – As medidas em vigor, incorporadas no cenário de referência, desempenham um papel importante para o cumprimento das metas, importando assegurar que o respectivo impacte em termos de emissões é o esperado. A execução destas medidas deverá, assim, ser objecto de monitorização tendo em vista a sua avaliação e a intervenção no meio e nas circunstâncias envolventes de forma a atingir os objectivos definidos. Espera-se que o conjunto das medidas incluídas no cenário de referência permita reduzir de 7,6 Mt a 8,8 Mt CO(índice 2)e no período 2008-2012, face ao cenário business as usual.
3 – Com a entrada em vigor do comércio europeu de licenças de emissão em 1 de Janeiro de 2005, que abarca um número significativo de instalações, importa repartir o esforço de redução de emissões de gases com efeito de estufa por todos os agentes. Esta assunção esteve presente na definição do conjunto de medidas adicionais cujo impacte, eficiência e eficácia importa aprofundar face à configuração final e enquadramento que forem decididos para as políticas, medidas e instrumentos propostos.
4 – Este pacote de medidas deverá estar pronto para entrar em vigor no momento de início do primeiro período do comércio europeu de emissões, ou seja, Janeiro de 2005. No momento presente (Junho de 2004) não está disponível informação que permita avaliar a redução esperada, nos dois períodos de mercado, de emissões de GEE em Portugal pela adopção deste instrumento.
5 – As medidas adicionais que se propõem no presente documento são de natureza sectorial e transversal, importando aprofundar a sua especificação em termos da sua inserção e coerência com as políticas definidas e a definir pelo Governo. Do conjunto equacionado, é possível esperar-se uma redução potencial de 6,7 Mt a 7 Mt de CO(índice 2)e.
6 – Partindo do pressuposto do cumprimento total da eficácia ambiental esperada das medidas contidas no cenário de referência e adicionais, não é possível atingir os níveis de emissão de GEE por forma a cumprir o objectivo estabelecido no seio da União Europeia. De facto, depois da redução esperada, torna-se necessária uma redução adicional de 1,7 Mt a 5,6 Mt de CO(índice 2)e.
7 – Assim, e não esquecendo a actual indisponibilidade de informação sobre a redução esperada pelo comércio europeu de licenças de emissão, deve equacionar-se a necessidade de recorrer aos mecanismos de flexibilidade estabelecidos no Protocolo de Quioto, assentes em projectos de implementação conjunta (IC) e de desenvolvimento limpo (MDL) e no comércio internacional de licenças de emissão. Desta forma, importará, concomitantemente com a elaboração do PNALE, proceder à definição por parte do Governo Português da estratégia da utilização dos mecanismos de Quioto para efeitos de obtenção de créditos, quer no âmbito da Directiva do Comércio Europeu de Licenças de Emissão, cuja articulação está em discussão, quer em aquisição directa para efeitos de cumprimento nacional.
8 – Finalmente, importa explicitar a forma como se lidará com a incerteza associada à eficácia ambiental das medidas e acções contidas no cenário de referência e adicionais. Sendo certo que, para algumas das medidas adicionais, não foi possível quantificar, nesta fase, o seu impacte em termos de redução de emissões de GEE, dado estar em equação a sua configuração final, deve destas medidas esperar-se um contributo significativo, directo e indirecto, para a redução de emissões.
9 – Assim, a primeira abordagem deve assentar num sistema eficaz de monitorização da sua execução, para o que é necessário definir o quadro operacional e de responsabilidade. A segunda abordagem deve considerar a preparação de um conjunto de medidas de emergência, a adoptar em 2008, caso se constate um afastamento significativo da linha de cumprimento.
(nota 1) O cenário de referência encontra-se disponível desde o início de 2003 no site do Instituto do Ambiente (www.iambiente.pt).
(nota 2) Em termos genéricos, estes agentes correspondem a parte do universo dos agentes abrangidos pelo diploma relativo ao controlo e prevenção integrados de poluição (PCIP) (instalações de combustão, refinarias, fornos de coque, indústria da produção e processamento de metais ferrosos, mineral, pasta de papel e papel), mais as instalações de combustão com input térmico entre 20 MW e 50 MW.
(nota 3) A Comissão Europeia reserva o direito de aprovação/veto (parcial ou global) dos planos nacionais de atribuição de licenças de emissão.
(4) Dados relativos a «Sistema colectivo para valorização e tratamento conjunto de resíduos pecuários e agro-alimentares» do Landal (ADENE, 2001).
(5) Gama inferior aplicável apenas às instalações não abrangidas pelo comércio europeu de licenças de emissão, enquanto a gama superior de valores se refere a todas as instalações.
(nota 6) P. Hazell, «The design of policy relevant monitoring systems for natural resources», Environmentally and Socially Sustainable Development (ESSD) Network, World Bank, 2000.
(nota 7) Por objectivo entenda-se não só o grau mas também o calendário da execução.
Articulação do PNAC e do comércio europeu de licenças de emissão
O Programa Nacional para as Alterações Climáticas constituirá o documento de referência no que se refere ao ponto de situação das emissões de gases com efeito de estufa e das políticas, medidas e instrumentos definidos ou a definir para fazer face aos compromissos internacionais de Portugal quanto a metas de emissão de GEE.
O comércio europeu de licenças de emissão, regulado pela Directiva n.º 2003/87/CE, de 13 de Outubro, obrigará os Estados membros e os operadores abrangidos a desenvolver um conjunto de acções bem tipificado, de forma que o regime entre em vigor em 1 de Janeiro de 2005.
O Programa Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão (PNALE) deverá ser depositado na Comissão Europeia para apreciação. Trata-se do primeiro momento de grande responsabilidade no que se refere à participação de Portugal num sistema internacional de comércio de emissões, considerado pela União Europeia como um dos instrumentos de maior alcance no âmbito da sua política comum de controlo das emissões de GEE.
Os resultados do PNAC revestem-se, assim, de grande importância para a fundamentação das propostas a incorporar no PNALE quanto a metas de redução de CO(índice 2) e para a fundamentação das propostas de cumprimento das metas acordadas nos acordos de burden sharing.
A proposta do tecto global de emissões de CO(índice 2) a considerar nos diferentes períodos, assim como a sua distribuição por actividades e instalações, tomará os resultados do PNAC como referência imprescindível.