Fonte: tsf.pt
Grupo de trabalho criado pelo Governo avaliou os riscos da pandemia para a agricultura portuguesa. Muitas empresas de vários setores têm a sobrevivência ameaçada.
O Grupo de Acompanhamento e Avaliação das Condições de Abastecimento de Bens nos Setores Agroalimentares e do Retalho, criado pelo Governo, detetou uma série de problemas que podem surgir na agricultura portuguesa por causa da Covid-19, sendo que alguns efeitos já se começaram a sentir de forma concreta.
Alguns desses efeitos que já se sentem estão no setor do vinho, um dos mais importantes da agricultura nacional. Segundo o documento fechado esta semana, consultado pela TSF, “o encerramento da restauração e da hotelaria, com a quebra abrupta do turismo, estarão a diminuir o consumo doméstico anual entre os 30% a 35%”.
Uma descida abrupta estimada por baixo, ou seja, “caso a atividade económica retome a partir do final do mês de maio”, o que não é certo que venha a acontecer, dependendo da evolução da doença no país.
“Gravíssimas implicações futuras” em todo o setor do vinho
“O cancelamento de encomendas internacionais (e obstáculos logísticos na exportação para os mercados europeus) e a perda de poder de compra que se seguirá, agravarão a previsível quebra anual nas vendas na ordem dos 50%”. Sem capacidade para armazenar, com mais stocks por vender e com a próxima vindima a caminho o preço das uvas e do vinho deve descer “fortemente”.
Outro problema: o muito menor volume de negócios e a previsível falta de liquidez das empresas, num setor que o grupo de trabalho diz ter 76,6% de microempresas, “implicarão a sua deterioração, provocando o encerramento de muitas delas, com gravíssimas implicações futuras em todo o cluster do vinho e da vinha nacional”.
Porcos (e leitões) em risco
As ameaças e problemas sobre o setor da agricultura e pecuária estão no entanto longe de se ficar pelas uvas e pelo vinho.
Nos suínos, o documento sublinha que o setor estava a atravessar uma boa fase, nomeadamente com o aumento de 78% das exportações para a China. Contudo, uma das ameaças que agora existe está relacionada com a alimentação dos animais, pois o “fecho de unidades de extração de oleaginosas na União Europeia, por falta de procura para biodiesel, resultará na falta de disponibilidades de bagaço de colza e soja, a principal fonte de proteína utilizada pela alimentação animal”.
Também nos leitões “as capacidades de congelação são limitadas e os matadouros não conseguem pagar aos produtores, uma vez que não estão a vender”.
Produção de cereais comprometida
No milho temem-se “eventuais dificuldades nas importações para garantir o aprovisionamento das indústrias, quer para alimentação humana, quer animal, por perturbações nos mercados de origem tradicionais, ou nos transportes”.
No trigo, que Portugal tem produzido cada vez menos nos últimos anos, o grupo de trabalho sublinha que, “como é referido pelas confederações de agricultores, é bastante provável que a produção de cereais, principalmente os de primavera/verão venha a estar comprometida, reflexo de constrangimentos na obtenção de sementes e de fatores de produção”.
É essencial, refere o documento, garantir a manutenção de um “corredor verde” ao nível europeu para garantia de transporte prioritário de produtos agrícolas, de matérias-primas, alimentos para animais, oleaginosas e cereais.
Flores e plantas ornamentais já estão a ir para o lixo
No arroz, há receios de “eventuais dificuldades nas importações para garantir o aprovisionamento das indústrias sobretudo para alimentação humana, mas também para a indústria de alimentos para animais”.
Nas frutas e legumes, as preocupações estão, por exemplo, na “possibilidade de rutura de stocks de fatores de produção, por impossibilidade de acesso a pontos de aquisição específicos como os fitofármacos”.
Finalmente, o setor das flores e plantas ornamentais depara-se já hoje com enormes prejuízos que podem colocar em causa a manutenção dos postos de trabalho – e que colocarão mesmo em risco as vendas futuras. Tudo por causa da impossibilidade de vender para os principais mercados de exportação (“França, Alemanha, Inglaterra, Espanha, que estão completamente bloqueados”) e com o mercado português a ter hoje “vendas residuais”.
As empresas de flores e plantas ornamentais já iniciaram mesmo a destruição de plantas que não foram vendidas.
Governo promete Plano
O Ministério da Agricultura já anunciou que iniciou o processo de elaboração de um Plano de Medidas Excecionais para o setor agroalimentar no contexto da crise do coronavírus.
Segundo o Governo, a meta é “garantir as condições de funcionamento do complexo agroalimentar, garantindo a segurança do abastecimento alimentar, num contexto de fortes restrições de circulação de pessoas e mercadorias, e, ainda, mitigar o efeito nos subsetores com quebra de procura”.