Portugueses dizem que governo português não deve hesitar em chumbar a proposta se esta não for conveniente ao país. Programa Horizonte Europa, gerido por Carlos Moedas, é reforçado para cem mil milhões de euros.
A Comissão Europeia apresentou ontem um «orçamento moderno, pragmático e realista», para o período de sete anos, a partir de 2021. A proposta que define montantes e prioridades do dinheiro europeu terá de cobrir novas áreas, como a segurança, a defesa e as migrações. «Contra a vontade» de Jean-Claude Juncker há menos dinheiro para as políticas históricas. «Tivemos de aceitar, talvez até contra vontade, reduções na Política Agrícola Comum (PAC) e a na Política de Coesão», admitiu o presidente do executivo comunitário, Jean-Claude Juncker, na apresentação da proposta de 1279 mil milhões de euros, que representa 1,114 por cento do conjunto dos produtos internos brutos (PIB) da União Europeia.
Juncker tentou vincar a ideia de que as políticas, que até aqui representam 80 por cento do dinheiro europeu, «continuam a ser importantes e as principais na União Europeia tal como a conhecemos». Mas, em diversas capitais europeias, as reações foram rápidas, criticando a modéstia da proposta, nomeadamente nos chamados países da coesão, em que se inclui Portugal.
Em Lisboa, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, considerou que as negociações «começaram mal», perante um orçamento com um «valor insuficiente». O Presidente da República juntou-se às críticas, considerando tratar-se de um «mau começo». Num tom mais duro, Capoulas Santos considera a proposta de corte na PAC «inaceitável para Portugal».
No Parlamento Europeu, à esquerda e à direita, os deputados portugueses lembram que a aprovação do Quadro Financeiro Plurianual requer unanimidade no conselho e, em declarações ao Diário de Notícias, alguns consideram que o governo português não deve hesitar em chumbar a proposta se esta não for conveniente ao país.
«Se Portugal vir que os interesses não estão acautelados, o que deve fazer é, no Conselho Europeu, votar contra, uma vez que tem a possibilidade de bloquear o acordo», vincou o deputado José Manuel Fernandes (PSD), lembrando que o acordo firmado entre o governo e os sociais-democratas é para que seja garantido «no mínimo o mesmo envelope» do atual Quadro Financeiro para a PAC e a Coesão.
Do lado oposto da bancada, João Ferreira (PCP) frisa que «os Estados estão todos em pé de igualdade e, portanto, só haverá uma proposta contrária aos interesses de Portugal se o governo português aceitar essa proposta». Para o deputado comunista, os cortes representam a «centralização da execução do Orçamento da União Europeia, pela redução de verbas de gestão nacional».
Pedro Silva Pereira (PS) considera que se trata de uma «proposta muito insuficiente» e que vai «ter de ser melhorada», tendo em conta o montante total que «fica aquém do esperado». Mas o eurodeputado aponta também «cortes violentos», da ordem «dos 10 por cento» no total do volume que é absorvido por Portugal, em determinados programas.
«Não é um bom orçamento, nem para a União Europeia nem para Portugal», lamenta Marisa Matias, referindo-se aos cortes «que poderão ser muito maiores do que o anunciado», feitos em nome de uma «obsessão com a militarização e a criação de uma unidade específica de financiamento para a defesa”, para a qual está previsto um montante de 13 mil milhões de euros, destinados a projetos de investigação e como complemento inicial para aquisições.
A pensar no período de negociações que se avizinha, Nuno Melo (CDS) desafia a «capacidade reivindicativa» de António Costa, para defender os «interesses do Estado português». Ainda não estão definidos os critérios para a distribuição das verbas. Porém, o português que integra o núcleo restrito de eurodeputados encarregados das negociações, José Manuel Fernandes, considera que o comissário da Agricultura, Phill Hogan, já aponta um critério quando coloca Portugal entre os países livres dos cortes anunciados de quatro por cento nos pagamentos diretos por hectare, no âmbito da PAC.
Noutra área, o eurodeputado João Ferreira entende que o montante de 25 mil milhões previsto para reformas estruturais, no capítulo da Política de Coesão, demonstra que «aos critérios de condicionalidade macroeconómica juntam-se agora critérios de condicionalidade política».
Ao final do dia, o comissário português Carlos Moedas era o único que podia anunciar uma vitória. O montante para a ciência fica aquém da expectativa criada pelo presidente no discurso sobre o estado da União. Mas num orçamento caracterizado por cortes, as áreas geridas pelo português Carlos Moedas, no programa Horizonte Europa, sucessor do Horizonte 2020, são reforçadas, para cem mil milhões de euros. «É uma boa notícia para aquilo que é o futuro da Europa, pois vamos investir mais em ciência, inovação, digital e em tudo o que é a competitividade europeia», afirmou o comissário, depois de ser anunciado «o maior aumento na ciência desde que começaram os programas-quadro».
Fonte: Diário de Notícias