Maria do Céu Antunes: “Este é um plano estratégico para a agricultura muito ambicioso”

Confagri 29 Nov 2022

Fonte: dn.pt

A ministra da Agricultura apresenta esta terça-feira em Gaia o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum para Portugal, um programa de investimentos no valor de 6713 milhões de euros que entrará em vigor a 1 de janeiro de 2023 e se prolongará até 2027.

O Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) que hoje vai apresentar abrange uma janela entre 2023 e 2027. De que investimento é que estamos a falar e quais são os pilares que o compõem?
O PEPAC é um pacto financeiro de 6713 milhões de euros que vai ser utilizado em janeiro de 2023 e com o investimento a poder ser concluído até ao final de 2029, o período é de 2023-2027 com mais dois anos. Estes 6700 milhões de euros estão divididos em dois pilares: um primeiro pilar de apoio ao rendimento, que representa 3860 milhões de euros, sendo que está dividido num eixo de rendimento e sustentabilidade, representando 3487 milhões de euros, e depois os programas setoriais, que são cerca de 372 milhões de euros. A grande novidade no primeiro pilar tem a ver com o primeiro eixo, os 3487 milhões, em que 25% deste valor só é atribuído ao agricultor se cumprir um conjunto de regras de produção sustentável em adição àquilo que já está obrigado a fazer para receber a outra componente. Ou seja, há 75% onde o agricultor vai ter apoio ao rendimento cumprindo um conjunto de requisitos, a chamada condicionalidade de base de produção sustentável, mas para poder receber os 100% vai ter que cumprir mais, por exemplo em relação à produção integrada, à sustentabilidade através da agricultura biológica. O segundo pilar, que representa 2853 milhões de euros, está dividido em quatro eixos: dois para o continente – o eixo do desenvolvimento rural, com aproximadamente 2096 milhões, e a abordagem territorial integrada, que são 310 milhões – e depois há pacotes financeiros para os Açores e a Madeira, com 231 milhões e 141 milhões de euros, respetivamente. Passamos a ter objetivos com base nos resultados e numa avaliação anual que é feita e que depois, de dois em dois anos, pode ou não ter consequências para o Estado-membro, que pode levar, inclusivamente, à perda de apoios caso os objetivos não sejam cumpridos. Este é um plano estratégico muito ambicioso, até porque tem aqui um período de tempo para implementação mais curto, atendendo a que 2021 e 2022 foram períodos de transição.

Além destas linhas orientadoras, que outras apostas tem este documento?
Queremos reforçar o papel da agricultura e das florestas na promoção da coesão social e territorial, mas que isso possa significar também tornar o nosso país mais preparado para situações como estas que temos estado a viver nos últimos três anos. Preparado para poder dar resposta às alterações climáticas e depois pegar nas ferramentas tecnológicas para podermos ter uma agricultura mais preparada, nomeadamente para o rejuvenescimento. Portugal, à semelhança do que acontece na União Europeia, tem uma média etária de 65 anos dos seus agricultores e nós precisamos claramente mostrar também aos jovens que a agricultura é uma agricultura moderna, preparada para os desafios com que hoje estamos confrontados e onde a tecnologia tem que estar subjacente a estes modelos.

Essa vontade de rejuvenescimento poderá esbarrar na demografia, tendo em conta que temos 182 idosos por cada 100 jovens e que o índice de rejuvenescimento da população ativa baixou. O que têm planeado para atrair os jovens?Vamos ter taxas majoradas para os jovens agricultores, que podem ir até à taxa máxima de 80% e o prémio para a instalação do jovem agricultor pode ser majorado até 75%, consoante as suas opções. Por exemplo, se o investimento for superior a 80 mil euros, o prémio pode ser majorado em 25% se o jovem estiver em exclusividade, e se escolher o interior para se instalar pode ir até 75%. Isto são medidas que querem atrair mais jovens, mas não vão alterar a nossa pirâmide demográfica. São outras as políticas que também vão ajudar, nomeadamente criar – como está no Orçamento para 2023 – as creches gratuitas, o IRS Jovem, o apoio ao arrendamento, onde claramente o que queremos fazer é criar condições para que os jovens possam ter mais filhos e sentir o conforto de um Estado que está ao seu lado. Mas, voltando à agricultura, não podemos esquecer que os jovens querem uma agricultura que seja mais competitiva e que a mesma, enquanto atividade económica, tem que dar lucro, e por isso precisamos mostrar que a tecnologia, nomeadamente a transição digital e a transição climática, está a alavancar esta agricultura que queremos promover com o investimento para o seu rejuvenescimento.

Também vão apostar na equidade entre regiões.
O ponto talvez mais importante deste plano estratégico diz respeito ao desafio que se coloca de equidade entre regiões e entre agricultores. Temos dados, nomeadamente do licenciamento agrícola que foi feito em 2019 e também do diagnóstico estratégico que fizemos, que nos fazem sentir que estes desequilíbrios estão associados à dimensão das explorações, ao nível do apoio que é dado e ao nível do desenvolvimento tecnológico e do conhecimento. E, portanto, aquilo que dizemos da gestão ativa do território é que queremos atribuir apoio a quem produz e a quem produz de forma sustentável, e queremos com isso ter uma maior equidade na distribuição dos apoios. Vamos fazer o processo de convergência, que tinha sido interrompido anteriormente. Queremos chegar a 2026 com uma distribuição dos apoios à produção iguais em todas as regiões e vamos reforçar, nomeadamente, o pagamento base e o pagamento redistributivo para podermos ajudar as explorações mais pequenas, abaixo dos 20 hectares.

Uma das medidas deste plano é o Fundo de Emergência Rural, que representa um apoio simplificado em situações de calamidade.
Nós já temos atualmente a Medida de Restabelecimento do Potencial Produtivo, em que, no caso de incêndios, no caso de um tufão, em situação de calamidade natural, esta medida só pode financiar, do ponto de vista das regras comunitárias, prejuízos acima dos 30%. O que acontece é que muitas vezes, em situações desta natureza, são estragos que não chegam a atingir esses 30%, mas que são grandes do ponto de vista daquilo que são as repercussões na vida dos agricultores e dos produtores. Por isso criámos este fundo de emergência para podermos acorrer a estas situações de calamidade de forma muito expedita, através de um apoio voluntário, cheque na mão, de forma mais transversal, mais rápida, muito mais eficiente. Dou-lhe um exemplo: imagine agora nos incêndios deste verão que um aviário fica parcialmente destruído, mas depois de feitas as contas, depois de avaliados os estragos, apenas chega aos 20%. Esses 20% podem significar muito para aquele produtor e podem inviabilizar toda a atividade e, portanto, não podendo recorrer a esta medida que vai continuar, do Restabelecimento do Potencial Produtivo, este fundo de emergência vai-nos possibilitar fazer estes apoios.

Este mecanismo já tem dotação?
São 11 milhões de euros.

Uma das calamidades recorrentes em Portugal são os incêndios florestais, e no PEPAC falam na promoção de uma silvicultura sustentável. Como está Portugal em termos de reflorestação?
Vou pedir-lhe para passarmos esse ponto, pois as florestas são de outra área governativa e não tenho esses dados comigo. A PAC financia uma parte daquilo que são as políticas florestais, e que foram definidas pela área governativa do ambiente, e nós fazemos a gestão dessas mesmas medidas de acordo com o pacote financeiro aprovado. O que está previsto neste nosso plano estratégico é a promoção da silvicultura sustentável, apoiar 213 mil hectares para fins de florestação, agro-silvicultura e restauração, o desenvolvimento do mosaico florestal. Por exemplo, até aqui anualmente colocávamos no mosaico florestal 500, 600 mil euros, e este ano foram 15 milhões de euros que colocámos para esta medida e é o que está previsto também no PEPAC. É nesse sentido que estamos a trabalhar. Dou-lhe um exemplo: Pampilhosa da Serra, que ardeu em 2017, tem neste momento pela primeira vez 30 hectares que foram floresta e agora vão ser vinha. Significa que vamos ter atividade produtiva rentável, que corta a floresta e impede a propagação dos incêndios.

Que país e que agricultura o governo pretende ter no final deste PEPAC em 2027?
Queremos ter um país onde a agricultura é uma atividade que continua a crescer. Atualmente, representa 5% do Valor Acrescentado Bruto, mas pode ir mais longe; 11% dos trabalhadores ativos, mas podemos ir mais longe; que exporta e que tem vindo a crescer do ponto de vista das suas exportações; que continua a importar e que vai continuar sempre – mas queremos que essas importações não ultrapassem as exportações e o grau de cobertura, à semelhança do que aconteceu nos últimos 20 anos, quase que duplicou. Queremos uma agricultura que sirva as pessoas, que essa agricultura produza alimentos em quantidade e em qualidade para os nossos cidadãos e para os compromissos que temos assumido, e que vamos continuar a assumir, com o mercado interno e com países terceiros, e para isso precisamos de ter uma agricultura que tenha mais jovens, que conte com todos, e com o apoio da tecnologia e do conhecimento para poder dar resposta aos desafios que se colocam e que dizem respeito às alterações climáticas.

As quatro confederações da agricultura portuguesa já criticaram a transferência das competências das direções regionais de agricultura e pescas para as CCDR, pedindo a revogação desta medida. O que implica esta transferência de competências?
As direções regionais de agricultura não vão ser extintas, vão continuar nos mesmos locais, com as mesmas pessoas, exatamente como estão, mas irá haver uma figura, o diretor regional, que possivelmente se deixa de chamar diretor regional, que vai passar a ser um elemento que participa diretamente na comissão de coordenação, sendo vice-presidente, um vogal, uma outra figura qualquer que ainda não está definida no seio do governo. Não há extinção, há, sim, a continuidade de todo o trabalho. A pessoa vai continuar a despachar com o ministro da Agricultura, e os fundos continuam a ser geridos da mesma maneira.

Como está Portugal em termos de armazenamento alimentar neste contexto de guerra na Europa?
Produzimos 86% de tudo aquilo que consumimos, leite e manteiga, pera-rocha, entre outros, muito acima dos 100%. Agora, há outras dimensões, como, por exemplo, os cereais, onde estamos longe de ter autonomia estratégica. Nós produzimos 18% dos cereais que consumimos. O trigo, nomeadamente o trigo panificável, importamos da França, que é um mercado que nos oferece estabilidade, 40% do milho que importamos vinha da Ucrânia e, portanto, ficámos aqui muito fragilizados desse ponto de vista. A primeira coisa que fizemos foi aumentar o tempo de armazenamento – passámos de 15 dias para um mês de reservas, mas ainda assim tivemos que recorrer a outros mercados terceiros. No entanto, o mercado está estável e, à semelhança do que aconteceu na pandemia, onde tudo parou e os agricultores não pararam, com a seca tivemos níveis de produtividade mais baixos, mas ainda assim conseguimos continuar a produzir para garantir o abastecimento, e as exportações até aumentaram – já estes primeiros oito meses de 2022 o aumento é de mais de 20%. E por isso aquilo que neste momento nos importa é olhar para o futuro. Nós, como definimos durante a presidência portuguesa, achamos mesmo que a Europa tem que ter condições para ter autonomia estratégica, percebemos isso em relação à energia, depois temos que o ser também em relação à alimentação. Estamos a trabalhar com o setor, temos uma estratégia para a promoção da produção dos cereais, onde, de acordo com o setor e com estudos feitos, é possível que cheguemos a 38% da produção dos mesmos.

Na semana passada foi desmantelada uma rede de tráfico de imigrantes no Alentejo que eram trazidos para trabalhar na agricultura. O que é que o Ministério da Agricultura pode fazer para combater estas situações?
Há a condicionalidade social que, pela primeira vez, está inscrita na PAC graças à presidência portuguesa e à reforma que tivemos oportunidade de fazer. E o que é que significa? Neste caso em concreto, havia uma investigação a ser feita que levou a este desfecho. Todos sabemos que há um deficit de mão de obra em muitos setores, não é só na agricultura, no turismo, na construção civil, e o que é facto é que se existem muito boas práticas para trazer trabalhadores de outros países para Portugal, existem outras que são criminosas, como é o caso em apreço. O governo está a fazer protocolos específicos e acordos. Fizemos com Marrocos, com a Índia. Temos acordos já entre os países para garantir que quem vem, vem em condições que não são estas. Chegam para trabalhar, sabem onde o vão fazer, onde é que vão ficar e têm todas as condições. E quando acabar vão-se embora ou, inclusivamente, e este é um trabalho que tem que ser feito intersetorialmente, como as nossas culturas são sazonais e não são todas ao mesmo tempo, podemos mapear e com isso ter uma rede de trabalhadores migrantes que vão circulando. E podemos fazer isso também com outras áreas da economia. Por um lado, esta é uma forma de termos a certeza de que conseguimos controlar fenómenos como este. Por outro, há aqui esta dimensão da condicionalidade social, em que através de inspeções que têm que ser feitas nós conseguimos detetar estas questões. Isso será através da Autoridade para as Condições do Trabalho ou fontes policiais ou outras que tenham estas incumbências, e com base na informação que nos for prestada, e, caso haja o envolvimento de empresas agrícolas, pode haver perda dos apoios que são atribuídos.

E neste caso em concreto?
Ainda não temos essa informação detalhada, mas esta condicionalidade só vai ser implementada a partir de 2024. Neste momento não temos como, não temos mecanismos.

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