As consequências da ofensiva militar russa à Ucrânia estão a espelhar-se nos preços dos produtos, em consequência da crise de fornecimento global. Desde os combustíveis, ao trigo, milho, e alguns metais e fertilizantes, estão a registar-se aumentos nos preços que chegam a ser históricos. Tal quadro explica-se pelo facto de a Rússia e a Ucrânia serem dos maiores produtores mundiais de matérias-primas.
A invasão russa da Ucrânia desencadeou uma crise na rede de fornecimento global e, consequentemente, um aumento acentuado do preço das matérias-primas. A falta de trigo e milho, provocada pela guerra, está a fazer subir os preços dos bens alimentares mais básicos, como o pão, o leite ou a carne – atingindo máximos históricos ou valores que não eram vistos há décadas.
O mesmo está a acontecer com outros materiais associados à indústria (como cobre, níquel e alumínio) ou mesmo o gás e o petróleo.
A cotação do barril de Brent, que serve de referência na Europa, atingiu a semana passado os 130,21 dólares (119,7 euros) por barril, próximo do máximo histórico atingido em julho de 2008.
“Atualmente, os preços de todas as matérias-primas são muito voláteis e a sua produção é incerta”, afirma James Maxwell, especialista em commodities da empresa australiana Rural Bank, ao jornal El País. Dois dos índices de commodities de referência subiram nas últimas semanas.
O S&P GSCI, que monitoriza as 24 matérias-primas mais vendidas no mundo, atingiu o valor mais alto dos últimos dez anos. O Bloomberg Commodity Index —composto por 23 contratos de commodities físicas, de petróleo bruto a milho, passando por alumínio ou gás natural— aumentou oito por cento desde o início dos ataques russos à Ucrânia, atingindo níveis que não eram vistos desde 2014.
“Estamos a testemunhar movimentos históricos. A comunidade internacional está a cortar uma importante linha de fornecimento de energia, metais e produtos agrícolas”, disse Olan Hansen, chefe de commodities do dinamarquês Saxo Bank, ao jornal espanhol.
Estes aumentos são explicados pelo facto de a Rússia e a Ucrânia serem dos maiores produtores mundiais de matérias-primas.
Os dois países controlam mais de um quarto do comércio internacional de trigo, quase um quinto do milho, e juntos controlam 52% do óleo de girassol do mundo, usado no processamento de alimentos.
Desta forma, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, os preços de trigo no mercado de Chicago (o mercado de referência) ultrapassaram os máximos históricos alcançados em 2008. Enquanto isso, os preços do milho e da soja atingiram os valores mais altos desde 2012.
Portugal, por exemplo, importa 90 por cento do trigo que utiliza para fabricar pão. Com a guerra, o abastecimento de trigo foi posto em causa e o preço do pão aumentou. Só na semana passada, o trigo aumentou 40 euros por tonelada. A maior parte do milho que chega a Portugal também é proveniente da Ucrânia. Com a sua escassez, é muito provável que os preços aumentem, nomeadamente na carne, leite e no peixe.
Os custos de fornecimento refletem-se no preço final dos produtos e esta semana, o aumento dos preços dos alimentos nos mercados já era visível. O secretário-geral da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED), Gonçalo Lobo Xavier, explicou à Antena 1 que os aumentos dos preços dos produtos nas prateleiras dos supermercados são inevitáveis face ao custo dos combustíveis.
Escassez de fertilizantes e aumento do preço dos metais
Para além da escassez de cereais e do aumento dos combustíveis, os agricultores enfrentam ainda uma escassez de fertilizantes. A Rússia é o principal exportador de ureia e o segundo de potássio. Juntamente com a Bielorrússia, país aliado do Kremlin, Moscovo é responsável por 40 por cento do mercado de potássio, um dos fertilizantes mais utilizados na agricultura. Para além disso, o potássio é também utilizado na produção do vinho, na conservação de alimentos, na indústria de chocolate e nos alimentos processados
A Rússia produz enormes quantidades de potássio e fosfato, ingredientes necessários aos fertilizantes.
“Metade da população mundial obtém alimentos como resultado de fertilizantes e, se isso for removido do campo para algumas culturas, [o rendimento] cairá em 50 por cento”, explicou Svein Tore Holsether, da Yara International, à BBC.
As consequências da guerra também se fazem sentir noutros metais industriais, fundamentais em vários setores. O alumínio, por exemplo, bateu um recorde histórico, superando os preços alcançados em 2008. O cobre, assim como o paládio, também atingiram máximos históricos. Mas o metal que registou um maior aumento de preço foi o níquel, com uma subida de 250 por cento em apenas 24 horas.
Usado no fabrico de aço inoxidável e na indústria de baterias de carros elétricos, o níquel viu o preço sofrer variações, na última década, entre dez mil e 20 mil dólares por tonelada. Após as duras sanções impostas à Rússia e com os stocks a atingirem níveis mínimos, o preço do níquel disparou para 48 mil dólares.