O ciclo de crescimento da economia portuguesa iniciado em 2014 acabou e parece «estar a iniciar a fase descendente», num «enquadramento internacional com riscos descendentes acrescidos que podem ter impactos elevados».
O alerta é do Conselho das Finanças Públicas (CFP), num relatório sobre Finanças Públicas que faz projeções para os cinco anos do período 2019-2023.
No ano passado, recorda o CFP, o Produto Interno Bruto (PIB) real diminuiu para 2,1 por cento (menos 0,7 pontos percentuais do que no ano anterior), «interrompendo o ciclo de aceleração observado entre 2014 e 2017». Foi só o primeiro sinal. O cenário que se avizinha para os próximos cinco anos é pior.
«As projeções do CFP apontam para um abrandamento gradual do crescimento da economia portuguesa ao longo de todo o horizonte de projeção (2019-2023). A redução do ritmo de crescimento do PIB real já observada em 2018 deverá prolongar-se, com uma taxa de variação anual de 1,6 por cento em 2019», nota o CFP. Esta projeção representa um desvio em baixa de 0,6 pontos percentuais face ao cenário do Governo.
O relatório do Conselho de Finanças Públicas regista mesmo que «com a exceção do Ministério das Finanças, cujo cenário mais recente implica uma aceleração do produto real de 2,1 pontos percentuais (p.p.) em 2018 para 2,2 pontos em 2019, todas as instituições internacionais perspetivam a manutenção ou mesmo desaceleração do ritmo de crescimento do PIB». No médio prazo, é expectável que o ritmo de crescimento da economia portuguesa estabilize em torno dos 1,5 por cento.
No que diz respeito a este ano, a desaceleração na taxa de crescimento da economia «ficará sobretudo a dever-se ao abrandamento das taxas de variação do consumo privado e do consumo público, que não é inteiramente compensado pela aceleração prevista do investimento». No restante horizonte de projeção, ou seja até 2023, sublinha o CFP, «refletirá a diminuição da taxa de crescimento das próprias exportações».
O CFP recorda que o comportamento das exportações foi mesmo «o fator determinante» para o perfil descendente da economia portuguesa em 2018, prosseguindo uma tendência iniciada na segunda metade de 2017. E, apesar de projetar uma aceleração ligeira desta componente em 2019, um crescimento 3,9 p.p. em termos reais, ou mais 0,2 pontos percentuais do que em 2018, as perspetivas para lá deste ano não são tão boas.
«As exportações deverão acelerar ligeiramente em 2019 (…) esperando-se para os anos seguintes um perfil de abrandamento contínuo. Em 2020, o ritmo de crescimento desta componente do PIB deverá reduzir-se 0,5 pontos percentuais para 3,4 por cento, convergindo a taxa de variação para um valor de 2,6 p.p. no médio prazo. A evolução das exportações acompanha a dinâmica esperada para a procura externa dirigida à economia portuguesa», escreve a instituição.
No mesmo sentido, e com base nos dados do FMI apresentados no World Economic Outlook (WEO) de outubro de 2018, o CFP projeta que «o ritmo de crescimento da procura externa dirigida à economia portuguesa desacelere progressivamente ao longo de todo o horizonte» até 2023.
Forte abrandamento da zona euro cria cenário negativo para Portugal
O abrandamento do crescimento mundial, sobretudo a «forte desaceleração do crescimento» na área do euro, «estabelece um quadro globalmente menos favorável» para a atividade económica em Portugal, «enfatizando o risco sobre as exportações e investimento», variáveis fundamentais para um crescimento sólido e sustentado da economia no médio e longo prazo.
Assim, conclui o CFP, «a economia portuguesa aparenta ter terminado a fase de expansão e estar a iniciar a fase descendente do ciclo num enquadramento internacional com riscos descendentes acrescidos que podem ter impactos elevados, ainda com fragilidades a nível interno e com um espaço orçamental reduzido». Face às projeções e previsões macroeconómicas do Governo e das instituições internacionais sobre a economia portuguesa, a projeção desta quinta-feira do CFP para o PIB de 2019 é a mais pessimista.
Este menor crescimento económico também faz com que o CFP projete uma «trajetória menos favorável» em relação ao saldo orçamental. «Sem novas medidas de política», o CFP projeta um défice de 0,3 por cento do PIB para este ano, superior em 0,1 pontos percentuais ao previsto pelo Governo. A estimativa do CFP para o défice orçamental de 2018 mantém-se nos 0,5 por cento do PIB, com a dívida pública a fixar-se em 121,5 p.p. do PIB.
«O desempenho orçamental esperado para 2019 sofre os efeitos da conjugação de dois tipos de medidas pelo lado da despesa, levando ao aumento desta em termos absolutos», explica o Conselho:
- De um lado estão as medidas permanentes «resultantes de opções políticas de reposição e/ou aumento de rendimentos», que afetam os valores e a dimensão das remunerações dos trabalhadores da Administração Pública e das prestações sociais.
- Do outro lado estão medidas temporárias, de que se destacam as medidas relacionadas com o setor financeiro, em especial no quadro da materialização de apoios ao Novo Banco a que o Fundo de Resolução (entidade pública e integrada no perímetro orçamental) se obrigou.
Ou seja, a ativação plena do mecanismo de capitalização contingente, na sequência de necessidades adicionais do Novo Banco, teria um impacto negativo de 0,4 pontos percentuais do PIB, levando o défice para 0,7 por cento em 2019.
O Conselho indica que, além das responsabilidades definidas no Acordo Quadro quanto à disponibilização de meios financeiros para a satisfação das obrigações do Fundo de Resolução, «existem outras obrigações que resultam do contrato de compra e venda e da adenda contratual, cuja informação não é do domínio público».
«No caso de o rácio de capital total do Novo Banco ficar abaixo do requisito de capital que é estabelecido pelas autoridades de supervisão, o Estado Português poderá ter de disponibilizar fundos adicionais para que o banco cumpra os requisitos regulatórios (Capital Backstop)», acrescenta. «Ambas as situações constituem um risco adicional para as finanças públicas».
A entidade agora liderada por Nazaré Costa Cabral indica que não considerou no seu cenário base de projeções nenhum daqueles potenciais riscos, mas criou um cenário adverso que inclui a utilização integral do limite máximo de 3.890 milhões de euros previsto no mecanismo de capital contingente até 2022, considerando a utilização de 1.149 milhões de euros em 2019, dos quais 400 milhões de euros já estão incluídos no cenário base do CFP, 850 milhões de euros em 2020 e 2021 e 249 milhões de euros em 2022.
O cenário adverso inclui também o impacto total daqueles montantes no saldo global, incluindo o seu impacto nos juros, e o aumento das necessidades líquidas de financiamento nos mesmos montantes, «admitindo que a nova dívida a emitir é financiada por Obrigações do Tesouro a 10 anos». Neste cenário adverso, o défice iria fixar-se nos 0,7 por cento do PIB em 2019 e nos 0,5 pontos em 2020, face ao défice de 0,3 e 0,1 por cento do PIB previstos, respetivamente, no cenário base.
Investimento a cair a seguir a ano de eleições
Em 2019, ano de eleições europeias e de legislativas, em Outubro, o investimento vai acelerar ligeiramente, «em resultado de investimentos em curso no setor da energia e da concretização de investimento público programado, entre outros, apresentando um crescimento de 5,4 por cento em termos reais, mais 1,0 pontos percentuais do que em 2018. No entanto, nos anos logo a seguir entra «numa trajetória de abrandamento» até ao final do período em análise, até 2023.
«A redução mais expressiva na taxa de variação da Formação Bruta de Capital Fixo (investimento) deverá ocorrer em 2020, recuando 1,2 pontos percentuais para 4,2 por cento, antecipando-se para o resto do horizonte de projeção reduções de 0,4 pontos por ano. De acordo com o atual cenário, o ritmo de crescimento da FBCF deverá estabilizar em torno de 3,0 por cento no médio prazo, contribuindo a evolução desta componente de forma substancial para o abrandamento do PIB», escreve o CFP.
Por outro lado, no período até 2023, a dívida pública vai manter uma trajetória descendente, passando de 121,5 por cento do PIB no final de 2018 para 104,1 por cento do PIB em 2023. «Entre o final de 2018 e 2023, projeta-se que o rácio diminua 17,4 pontos percentuais do PIB, o que compara com uma diminuição de 7,5 pontos percentuais nos últimos cinco anos».
Fonte: Observador