Alejandro Fuentes Espinoza, diretor da OIV, em entrevista ao Expresso
O chileno Alejandro Fuentes Espinoza, diretor de viticultura da Organização Internacional da Vinha e do Vinho, vem ao Porto participar na Climate Change Leadership certo de que o aquecimento global «é para todos» e significa subida de temperaturas, sim, mas também mais doenças e até novas doenças.
O diretor de viticultura da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) admite que os vinhos do futuro serão diferentes, por força do clima e do gosto do consumidor. E deixa uma nota de confiança ao Expresso: «A vinha é uma planta com uma capacidade da adaptação muito forte».
O aquecimento global é um problema mais do velho mundo do vinho (Europa), ou também dos novos produtores (América, África do Sul, Austrália)?
Se há uma coisa de que podemos ter a certeza é que o aquecimento global é para todos e as mudanças climáticas afetam todos da mesma forma, à escala global. Depois, haverá especificidades em função de cada clima em particular. Em França ou em Portugal, por exemplo, vão registar-se fenómenos extremos associados às alterações climáticas que podem ser diferentes dos que o Chile ou a África do Sul terão de enfrentar.
E quais são neste momento os impactos mais visíveis que as alterações climáticas estão a impor no mundo do vinho?
Subida de temperatura, aumento dos fenómenos climáticos extremos como seca ou granizo, mudanças rápidas e acentuadas de temperatura. E tudo isto tem, naturalmente, impacto na vinha porque a planta fica submetida a stress hídrico, temperaturas muito elevadas ou muito altas, granizo, coisas que podem comprometer toda a vindima de um ano. A tendência também é vindimar mais cedo. De setembro passamos para o final de agosto e talvez dentro de uns anos estejamos a começar os trabalhos no início de agosto ou até em julho.
Há doenças da vinha provocadas pelo aquecimento global?
Também implica stress ao nível das doenças da vinha, sim., e diz-se que há uma ligação direta entre mudanças climáticas e doenças. Mas esse é um ponto que ainda está em estudo. Em teoria, o aquecimento global significa aumento de doenças e até alteração dessas doenças. Países como o Chile passam a ser confrontados com novas doenças que não tinham. Na verdade, estamos a falar de um problema que pode mexer com tudo.
E as regiões produtoras vão mudar?
Sim. Os climas estão a mudar. Em 10 ou 20 anos, vamos ter países que hoje não produzem vinho como produtores. Fala-se nos casos da Inglaterra e da Escócia. Na verdade, já há produtores a comprarem terrenos lá para terem vinhas. E há regiões que nunca produziram vinho, mas começam a plantar vinha, em países como a Alemanha ou a Bélgica. E há uma tendência clara para subir até pontos mais altos porque o calor aí é menor.
Isso pode significar que podemos descobrir novos vinhos de referência, completamente diferentes dos atuais, no futuro?
Vamos continuar a ter vinhos de qualidade, mas é provável que sejam diferentes. Temos de pensar sempre em duas coisas base no mundo do vinho: qualidade e tipicidade. Podemos continuar a produzir vinhos de qualidade, mas a tipicidade de um vinho português, francês ou espanhol pode vir a mudar. Este é um jogo em que não podemos esquecer os diferentes tipos de práticas vitícolas ou uma possível mudança de castas para variedades mais aptas ao novo clima de uma região, de forma a poder dar resposta à exigência de qualidade mantendo a tipicidade de um vinho. Mais: De um lado temos a produção, do outro temos a evolução do gosto do consumidor. E a qualidade também tem de responder a esta evolução. Hoje não bebemos os vinhos que bebíamos há 200 anos. Na verdade, essa é a história do vinho.
A vinha não está em risco?
Não devemos esquecer que a vinha é uma planta com uma capacidade de adaptação muito, muito forte. Existe em climas tropicais como a Colômbia ou o Brasil, mas também na Rússia.
No que já se faz hoje, no terreno, para enfrentar os desafios do clima, o que considera mais importante?
Temos muitas medidas e ações concretas. No curto prazo, podemos falar da estrutura da vinha, da gestão do solo e das vindimas ou de técnicas enológicas para aumentara acidez ou reduzir o álcool. Muitos. No médio prazo, há fatores como a escolha dos locais para plantar as vinhas. No longo prazo, podemos falar de irrigação ou mudança de castas.
E estamos a falar de que castas no futuro? Há castas em risco?
Há castas mais sensíveis, mas não podemos generalizar, até porque todas serão confrontadas com a mesma problemática.
Fonte: expresso.pt