Especialistas referem que a azeitona «tem menos água, mas mais gordura» que o habitual e nos lagares o rendimento obtido está «dois por cento acima do normal para a época».
O dia é de sol e as temperaturas são amenas para a apanha da azeitona e são muitas as pessoas que se espalham pelos muitos olivais transmontanos, para a apanhar o fruto.
Às portas de Jou, aldeia de concelho de Murça, encontramos Rafael Sousa, de 26 anos. O olival tem cerca de 120 oliveiras e para a apanha juntou a família, cerca de dez pessoas.
Preparado o terreiro, estendem-se os toldos, homens e mulheres cercam a oliveira e dão início ao movimento de mãos na ramagem, que é varejada com varas, uma já elétrica, que facilita o trabalho. «A produção é mais baixa, mas ainda há bastante e a qualidade é boa», diz Rafael.
O olival que é novo, «o ano passado produziu 900 quilos, mas este ano deve dar menos, porque o ano foi de seca». A azeitona e o azeite são para consumo de casa.
Isabel Sousa, de 43 anos, vai puxando o toldo para que nenhuma azeitona se perca no chão, e atesta a qualidade do fruto. «Temos bastante e boa azeitona e bem grandinha. E com este tempo apanha-se bem», diz à Renascença.
O trabalho não é difícil. «Não custa nada, porque a máquina ajuda a varejar. A azeitona cai toda no tolde e é só apanhar», conta Isabel, explicando que «das árvores pequeninas, a azeitona é apanhada diretamente com as mãos, porque não convém andar a bater».
Ao contrário das expectativas de catástrofe devido à seca, a campanha da azeitona em Trás-os-Montes e Alto Douro regista quebras inferiores às esperadas e quantidades de azeite semelhantes ao ano anterior.
«O que estávamos a pensar há dois meses melhorou, porque a azeitona, quando se começou a ressentir da seca, já estava em crescimento», refere Emanuel Batista, técnico da Associação de Olivicultores de Trás-os-Montes e Alto Douro (AOTAD).
Este técnico, em Outubro passado, previa uma má campanha com quebras na produção do azeite na ordem dos 70 por cento. Depois de iniciada a campanha e feito um levantamento no terreno, Emanuel Batista prevê agora quebras na «produção de azeite na ordem dos 15 por cento e na azeitona de 30 por cento».
«Por cada 100 quilos de azeitonas estão a ser obtidos 17 quilos de azeite, quando a média normal do início da campanha ronda os 15 quilos de azeite e isto quer dizer que o rendimento acaba por compensar a menor quantidade de azeitona».
Em termos de qualidade do azeite, prevê-se que seja «ótima, com todas as características que distinguem o produto desta região: muito frutado, doce, amargo, intenso ou picante».
As quebras de produção a nível internacional estão a originar um aumento da procura direta de azeitona na zona de Murça. Vários olivicultores têm sido abordados por compradores, sobretudo espanhóis, que oferecem preços aliciantes.
«É uma novidade no mercado regional», diz Francisco Vilela, dirigente da Cooperativa Agrícola de Olivicultores de Murça, que dá conta que «vários sócios estão a ser aliciados por particulares na compra de azeitona a valores muito altos».
Os intermediários são portugueses e estrangeiros que estão a «oferecer valores aliciantes para os produtores, a rondar os 60 cêntimos o quilo, verbas consideradas acima da média».
Esta situação pode «condicionar a vida das próprias cooperativas», alerta o dirigente associativo, porque é «azeite que vai para outros países e estamos a perder riqueza interna, porque não estamos a valorizar o nosso produto. A azeitona sai daqui a granel e não colocamos nós as nossas marcas no mercado internacional».
Com a venda direta, «não há mais-valia para o azeite de Trás-os-Montes», alerta Francisco Vilela, sublinhando que esta região é a segunda maior zona de produção de azeitona do país e o mais usual é a venda de azeite e não a comercialização direta da azeitona.
Na base desta procura por azeitona transmontana está, segundo este responsável, «as quebras na produção de azeitona e a escassez de azeite em outros países produtores europeus, como Espanha».
Trás-os-Montes e Alto Douro produz uma média de «80 milhões de quilos de azeitona» por ano e «17 mil toneladas de azeite».
Fonte: Renascença